Estudo sobre manejo de macaúba consolidado em nova publicação

O professor da UFV, Sérgio Motoike, especialista em macaúba, fala sobre o lançamento da obra que trata sobre a palmeira brasileira que pode auxiliar áreas degradadas, além de gerar alimento e biodiesel.

Desde 2004, um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de Viçosa (UFV) estuda o manejo e cultivo de macaúba. Após duas décadas de estudo, com publicações de artigos em revistas internacionais e com apoio da AcroAlliance, é publicado o livro Macaúba: do plantio à colheita, organizado pelo professor da UFV, Sérgio Motoike, e pelo Dr. Thomas Hilger, gerente do Acrocomia Hub na Universidade de Hohenheim, na Alemanha.

Com a colaboração de diversos especialistas nos diferentes aspectos do manejo da macaúba, o livro apresenta, em onze capítulos, uma análise abrangente dessa palmeira que vem ganhando relevância devido à sua alta produtividade e versatilidade. São abordados temas que vão desde o aprimoramento das mudas, alcançado por meio de pesquisas, até o melhoramento genético e o rendimento obtido em sua produção.

Capa do livro “Macaúba: do plantio à colheita”, publicação da Editora Oficina de Textos

Capa do livro “Macaúba: do plantio à colheita”, publicação da Editora Oficina de Textos

O Prof. Sérgio Motoike conversou com o Comunitexto sobre o processo de criação deste livro, que busca preencher uma lacuna informativa sobre o tema. Ele destacou a importância da macaúba não apenas no cenário nacional, mas também no contexto internacional. Confira a entrevista completa a seguir!

Comunitexto (CT): O que é a macaúba e para que serve?

Sérgio Motoike (SM): A macaúba, na verdade, é o fruto de uma palmeira conhecida como macaubeira, que se distribui por todo o território nacional, especialmente em Minas Gerais, São Paulo, Triângulo Mineiro, Goiás, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso.

A macaubeira produz um fruto rico em óleo de alta qualidade e valor, que pode ser utilizado na produção de combustível (inclusive para aviação), biodiesel e alimentos, além de ter aplicação nas indústrias farmacêutica e de cosméticos.

Além do óleo, a amêndoa da macaúba é extremamente rica em proteína, e a polpa apresenta alto teor de amido e fibra solúvel, podendo ser aproveitada na alimentação humana. Aproveita-se o fruto integralmente, sem gerar desperdício.

CT: Todas as partes dessa palmeira podem ser utilizadas? Como ocorre esse aproveitamento?

SM: Sim, todas as partes podem ser utilizadas. Da casca, produzimos energia para tocar a nossa planta industrial. Da polpa retiramos um tipo de óleo chamado de óleo de polpa, rico em ácido oleico e em tocoferóis. Após a retirada do óleo, do resto da polpa sobra fibra, amido e açúcares, que podem ser convertidos em alimentos ou em energia.

A semente possui uma parte rígida, a qual chamamos de endocarpo, que tem alta densidade, correspondendo a aproximadamente 40% do fruto. Ela produz um carvão de altíssima qualidade, que pode ser utilizado para produzir carvão ativado, ou ser usado na indústria para a produção de aço e de pellets, ou até para a produção de energia.

Uma das partes internas do fruto, a amêndoa, é chamada de mesocarpo e produz um segundo óleo que se equipara ao óleo de coco, sendo um óleo de cadeia carbônica curta a média, com alta demanda na indústria de cosméticos, na produção de sabões, sabonetes, cosmética fina, cremes para pele, entre outros.

Após a retirada do óleo da amêndoa, sobra o que chamamos de torta da amêndoa, que é riquíssima em proteína, chegando a ter até 35% de proteína de alto valor nutricional. Pode-se produzir inclusive leite materno vegetal com esse tipo de produto, que também é rico em fibra alimentar, podendo ser utilizado para consumo humano.

CT: Como surgiu a ideia da publicação sobre essa planta brasileira tão rica e versátil?

SM: Esse era um objetivo do nosso grupo de pesquisa da UFV, um grupo grande que trabalha com macaúba desde 2004 na universidade. Ao longo dessa jornada, muitas teses foram defendidas, muitas publicações foram realizadas em revistas de pesquisa internacional que publicam artigos científicos, e assim por diante.

Até então, existia uma demanda enorme por literatura. Todos que nos procuravam perguntavam se havia algum livro básico para ler e estudar a cultura da macaúba. E, antes desse lançamento, isso não existia; passa a existir a partir de agora.

Esse livro é um compilado de tudo o que aprendemos ao longo dos anos, em termos de pesquisa e desenvolvimento da cultura. Trazemos informações básicas, e a história do que acontecia antes, pois a macaúba não é uma cultura que foi descoberta em 2004; nós brasileiros, bem como os portugueses, os paraguaios e os indígenas, já a utilizavam para a alimentação, produção de óleo e de sabão, entre outros.

Em Minas Gerais, já existiram 17 indústrias de extração de óleo de macaúba. Na época, o processo de extração e aproveitamento ocorria por meio do extrativismo, ou seja, as pessoas iam na mata, coletavam os frutos da macaúba e os processavam.

Este é, contudo, um processo bastante rudimentar, e economicamente inviável hoje, por termos fontes de óleo com uma qualidade de profissionalismo demasiada, como é o caso da cadeia da produção de óleo de soja; assim, seria preciso competir com a soja se optássemos pelo extrativismo.

Entretanto, quando se cultiva a macaúba, a qualidade de seu óleo é muito superior à do óleo de soja, além de sua produtividade ser abundante, quase 10 vezes maior que a da soja.

Existe essa lacuna extensa de informações que as pessoas estão procurando, e é para resolver esse vácuo de material para estudo que elaboramos essa publicação.

CT: A obra conta com o patrocínio do projeto AcroAlliance. Poderia falar mais sobre o projeto e como ele influenciou a publicação?

SM: A AcroAlliance, que está patrocinando esse projeto, na realidade é como se fosse uma aliança de pesquisa dos grupos brasileiros com os grupos alemães. Os alemães se interessaram pela produção de biocombustível a partir da macaúba, e enviaram à nossa universidade uma equipe de pesquisadores, que ficaram aqui por um ano junto com os nossos estudantes, realizando os estudos.

Na época, eles vieram com os fundos pagos pela Lufthansa, empresa de aviação que tem interesse pela produção de combustível sustentável para avião, e estavam em busca dessa matéria-prima. Esse é o grande gargalo do projeto de produção sustentável de combustível para aeronaves: não existe uma cadeia, vamos assim dizer, que possa garantir a produção desse tipo de combustível.

Então, a ideia era exatamente utilizar a macaúba e desenvolver tecnologia sustentável para produzir esse produto, o óleo da macaúba, para ser transformado. Dessa forma surgiu o interesse dos alemães. E a AcroAlliance foi criada exclusivamente para que essa aliança pudesse dar passos largos no desenvolvimento dessa cadeia, porque precisamos desenvolver pesquisas, compreender como podemos plantar, e assim por diante.

O fruto desse projeto é a AcroAlliance, e o governo brasileiro a patrocinou através da FINEP, tendo investido recursos na AcroAlliance, e o mesmo ocorreu do lado alemão. A AcroAlliance trabalha, portanto, no desenvolvimento de pesquisa, e um dos frutos é a publicação desse livro.

CT: Qual é o potencial de mercado para a macaúba nos próximos anos?

SM: O potencial de mercado da macaúba é imenso, pois, se formos considerar o mercado de biocombustíveis, por exemplo, mesmo que se coloque nele tudo o que é produzido, esse “vazio” nunca será preenchido. É um mercado bastante próspero, que realmente pode ser concretizado em um futuro próximo.

CT: Quão favorável é o futuro para a macaúba em nível nacional e internacional?

SM: Há um futuro muito promissor, porque até hoje não se encontrou uma espécie tão promissora quanto a macaúba para resolver essas questões da agricultura sustentável. Já tentaram de todas as formas, mas nenhuma outra espécie estudada até hoje, no mundo, se equipara aos resultados que nós alcançamos com a macaúba. Então, do ponto de vista nacional e internacional, tem-se um futuro imenso.

Seu cultivo pode ocorrer tanto na América Latina como um todo, até em parte da América da Norte (principalmente regiões mais quentes, como a Flórida) e em uma parte significativa da África, do Sudeste Asiático e Oceania.

Então, é uma cultura com um potencial enorme. Nós estamos só começando esse trabalho que pode se transformar em uma cultura-chave para a agricultura mundial.


Sobre o organizador Sérgio Motoike

Sérgio Yoshimitsu Motoike

Sérgio Yoshimitsu Motoike é Engenheiro-Agrônomo pela Escola Superior de Agronomia de Paraguaçu Paulista e possui mestrado em Fitotecnia (Produção Vegetal) pela Universidade Federal de Viçosa. Foi o idealizador e um dos fundadores da empresa Acrotech Sementes e Reflorestamento LTDA, e atualmente é professor titular da Universidade Federal de Viçosa, com experiência na área de Agronomia, com ênfase em Fitotecnia e Melhoramento Vegetal.

Saiba mais sobre manejo de macaúba

O livro Macaúba surge com informações, pesquisas e práticas inovadoras relacionadas a essa espécie tão promissora, explorando sua diversidade genética, biologia peculiar e capacidade de adaptação a diferentes ambientes.

Botânica, origem, reprodução, melhoramento genético, nutrição mineral e muito mais — em 11 capítulos, o livro explora todos os aspectos que fazem da macaúba uma espécie singular e estratégica para o desenvolvimento agrícola sustentável.

Com uma análise minuciosa de todas as características da macaúba, esta obra é uma fonte inestimável de conhecimento para pesquisadores, agricultores e todos aqueles interessados no cultivo e no aproveitamento sustentável dessa planta.

Confira o sumário aqui.

Capa do livro “Macaúba: do plantio à colheita”, publicação da Editora Oficina de Textos

Capa do livro “Macaúba: do plantio à colheita”, publicação da Editora Oficina de Textos