Compreender as grandes regiões biogeográficas do meio ambiente é essencial não apenas para entender a evolução da biodiversidade, mas também para reconhecer como os ecossistemas se estruturam e interagem.
Ao analisá-las, podemos perceber como espécies semelhantes se encontram separadas por milhares de quilômetros e como ambientes aparentemente distantes compartilham raízes comuns no passado.
O que exatamente a biogeografia estuda na Terra?
A biogeografia estuda a distribuição dos seres vivos na superfície da Terra e os fatores que moldam essa organização ao longo do tempo.
Esse campo analisa desde padrões globais, como a diferença entre continentes, até detalhes locais, como a adaptação de espécies em micro-habitats. Além disso, conecta o estudo da biodiversidade com o:
- clima;
- relevo;
- geologia;
- história evolutiva.
Essa abordagem multidisciplinar ajuda a compreender por que certos animais e plantas prosperam em regiões específicas e como mudanças ambientais afetam esse equilíbrio.
Diferenças entre bioma, ecorregião e reino biogeográfico
Um erro comum é confundir termos como bioma, ecorregião e reino biogeográfico, embora cada um tenha função distinta. O bioma agrupa áreas com:
- clima;
- vegetação;
- fauna semelhantes, como o Cerrado ou a Tundra.
Já a ecorregião é mais específica, considerando aspectos locais de biodiversidade e processos ecológicos.
O reino biogeográfico é ainda mais amplo, abrangendo grandes extensões de território com características evolutivas únicas, como o reino Neotropical.
Importância do clima, tectônica e história evolutiva
A biogeografia mostra como fatores ambientais e geológicos determinam a vida. O clima define a disponibilidade de água e energia solar, essenciais à sobrevivência.
Já a tectônica influencia a separação de continentes, isolando espécies e gerando evolução independente.
A história evolutiva explica como adaptações e extinções moldaram comunidades, permitindo que regiões diferentes apresentem biodiversidade singular.

Quais são as classificações históricas das regiões biogeográficas?
As classificações históricas das regiões biogeográficas ajudam a entender como a ciência evoluiu na forma de mapear a vida no planeta.
Desde as primeiras propostas no século XIX até as atualizações modernas, houve um esforço constante de organizar padrões de biodiversidade em escalas globais.
Essas divisões refletem o conhecimento da época e foram sendo refinadas com novas descobertas científicas e tecnologias de análise.
Proposta de Sclater e evolução para Wallace
Em 1858, Philip Sclater sugeriu dividir o planeta em seis regiões, baseando-se principalmente em aves. Essa proposta foi precursora e abriu espaço para melhorias posteriores.
Alfred Wallace, considerado o pai da biogeografia, expandiu a ideia e refinou os limites entre áreas, levando em conta mamíferos e outros grupos. A linha de Wallace, por exemplo, tornou-se referência para distinguir as faunas asiática e australiana.
A atualização moderna: de 6 para 11 regiões biogeográficas
Com o avanço da ciência, especialmente da genética e da biologia da conservação, as seis regiões originais deram lugar a divisões mais detalhadas.
Hoje, muitos estudiosos reconhecem até 11 regiões biogeográficas, incluindo áreas como Oceania e Antártica de forma separada.
Essa mudança reflete o aumento de dados e a necessidade de maior precisão para políticas ambientais e estudos comparativos.
Como o esquema biogeográfico brasileiro está organizado?
O esquema biogeográfico brasileiro está organizado em domínios que representam a diversidade única do país.
Cada domínio reflete a combinação de clima, relevo e vegetação, resultando em ecossistemas distintos e ricos em espécies endêmicas.
Além disso, diversas propostas de regionalização foram feitas por pesquisadores, cada uma com foco em critérios diferentes, mas todas ressaltando a singularidade da biogeografia brasileira.
A biogeografia brasileira e seus domínios principais
O Brasil possui domínios como Amazônia, Cerrado, Mata Atlântica, Caatinga, Pampas e Pantanal. Cada um desses domínios abriga comunidades biológicas adaptadas às suas condições.
A Amazônia, por exemplo, concentra a maior diversidade do planeta, enquanto a Caatinga apresenta espécies resistentes à seca. Esse mosaico revela a complexidade do território brasileiro.
Regionalizações históricas (Rizzini, Cabrera & Willink, IBGE)
Pesquisadores como Rizzini e Cabrera & Willink propuseram divisões específicas do Brasil com base em vegetação e fauna.
O IBGE, por sua vez, consolidou um sistema de domínios morfoclimáticos ainda utilizado em planejamentos ambientais. Cada proposta buscou organizar o território de acordo com os avanços da ciência de sua época.
Qual é o papel da biogeografia de ilhas na conservação?
A biogeografia de ilhas desempenha papel crucial na conservação porque esses ambientes apresentam espécies únicas e altamente vulneráveis.
A teoria da biogeografia insular explica que quanto maior a ilha, maior a diversidade, e quanto mais isolada, menor a chance de colonização natural.
Assim, compreender esses padrões auxilia na criação de estratégias eficazes para preservar ecossistemas frágeis.
Teoria da biogeografia insular e ilhas continentais
Proposta por MacArthur e Wilson, a teoria da biogeografia insular descreve o equilíbrio entre imigração e extinção em ilhas. Isso explica por que ilhas pequenas tendem a perder espécies mais rápido.
Além das oceânicas, existem as ilhas continentais, que se formaram por separação geológica, abrigando espécies isoladas há milhões de anos.
Macaronésia e sua biogeografia única
A Macaronésia, composta por ilhas como Açores, Madeira e Cabo Verde, exemplifica como o isolamento cria biodiversidade singular.
Muitas espécies ali não existem em nenhum outro lugar do mundo. Contudo, a introdução de espécies exóticas e a urbanização colocam em risco esse patrimônio biológico:
- ilhas oceânicas: mais isoladas e frágeis;
- ilhas continentais: fragmentos antigos de continentes;
- Macaronésia: exemplo de biodiversidade única;
- risco constante: espécies invasoras e ação humana.

Como as ecorregiões e biorregiões complementam a classificação global?
As ecorregiões e biorregiões complementam a classificação global porque trazem um olhar mais detalhado da biodiversidade.
Enquanto os reinos biogeográficos abrangem áreas imensas, as ecorregiões permitem compreender processos locais de adaptação.
Esse refinamento é essencial para políticas de conservação, já que facilita identificar prioridades em escala regional.
Reinos, províncias e ecorregiões segundo WWF e IUCN
Organizações como WWF e IUCN desenvolveram classificações que incluem reinos, províncias e ecorregiões.
O WWF, por exemplo, divide o planeta em 14 biomas terrestres e mais de 800 ecorregiões. Esses recortes ajudam a definir áreas prioritárias para a proteção ambiental, com base em espécies endêmicas e ameaçadas.
A relevância das ecorregiões para conservação moderna
Na prática, pensar em ecorregiões facilita a aplicação de medidas específicas. Por exemplo, conservar uma floresta tropical úmida exige estratégias diferentes de proteger um deserto ou uma tundra.
As ecorregiões permitem esse nível de detalhe, assim tornando a conservação mais eficaz e adaptada à realidade de cada local.
Qual é a contribuição de Darwin para a compreensão da biodiversidade?
Desde que as ideias evolucionistas de Darwin passaram a ser aceitas como explicação do processo de diversificação da vida na Terra, ficou evidente que as diferenças entre faunas e floras de continentes distintos deveriam ser resultado de histórias evolutivas diferenciadas.
Hoje se compreende perfeitamente que a movimentação dos continentes ao longo da história geológica como decorrência das dinâmicas de afastamento e aproximação das placas tectônicas, associada às flutuações climáticas de longo prazo, foi a responsável por processos evolutivos diferenciados em vários pontos da superfície terrestre, o que levou a uma diferenciação significativa na composição da fauna e da flora em cada uma das assim chamadas regiões biogeográficas do planeta.
A deriva continental e sua aceitação científica
Na primeira metade do século XIX, todavia, não existia ainda a principal chave para a compreensão desse fenômeno, que é a aceitação e o entendimento da deriva continental, cuja teoria, central para a explicação do movimento dos continentes, foi proposta pela primeira vez por Alfred Wegener em 1912 e só completamente aceita a partir da metade do século XX.
A ocorrência fóssil da flora de Glossopteris na África, Austrália, Antártida, sul da América do Sul e Índia, as semelhanças no recorte litorâneo das Américas, da Europa e da África e a similitude de rochas e dinâmicas estratigráficas entre esses continentes foram alguns dos elementos que levaram esse autor a propor, por meio da teoria mencionada, que todos os continentes atuais foram originalmente parte de um único supercontinente, chamado de Pangeia.
No entanto, como naquele momento ainda não havia nenhum mecanismo geológico conhecido capaz de fragmentar e mover continentes inteiros, essa teoria precisou esperar até a década de 1950 para que pudesse fazer sentido, com a descoberta da movimentação das placas tectônicas.
Adolf Engler e sua classificação em quatro grandes zonas
Mesmo sem uma compreensão global dos mecanismos que promoveram tal diferenciação, o botânico alemão Adolf Engler (1844-1930) propôs, em 1879, uma primeira divisão ecológica do planeta levando em conta a distribuição de floras regionais visivelmente distintas.
Basicamente, ele dividia o mundo em quatro grandes zonas:
- o domínio boreal extratropical, englobando a América do Norte, a Europa e o continente asiático ao norte do Himalaia;
- o domínio paleotropical, englobando o continente africano do Saara para o sul, até as Índias Orientais;
- o domínio sul-americano, englobando a América do Sul e a América Central, até o México;
- o domínio do velho oceano, estendendo-se da costa chilena, passando pelo extremo sul da África, pelas ilhas do Atlântico Sul e pelo Oceano Índico, até a Austrália e parte da Nova Zelândia.
Contribuições de Sclater e Wallace
Da mesma forma que Engler, Philip Sclater propôs, em 1858, um esquema para a divisão ecológica do planeta levando em conta a distribuição dos principais grupos de aves, partindo do princípio de que todas as espécies haviam sido criadas dentro da área na qual são encontradas hoje em dia.
Essa divisão acabou sendo aceita e aprimorada por Alfred Russel Wallace, que incluiu dados de outras tantas espécies de vertebrados, incluindo mamíferos não voadores, os quais deveriam refletir as divisões naturais do planeta com mais precisão, tendo em vista as suas dificuldades de dispersão.
Ao aperfeiçoar a proposta de Sclater, Wallace propôs, em 1876, um mapa detalhado das seis regiões biogeográficas do planeta, documento este que serviu como referência para os biogeógrafos por mais de um século, permanecendo sem nenhuma modificação.

Mapa das seis regiões biogeográficas proposto por Wallace em 1876 (Imagem retirada do livro Biogeografia de Adriano Figueiró e publicado pela Oficina de Textos)
Ben G. Holt e um grupo de cientistas redividiram as seis regiões biogeográficas de Wallace em 11 regiões com base em informações mais detalhadas de distribuição de 20.000 espécies de aves, bem como, mamíferos e anfíbios, conforme a imagem a seguir.

Mapa das 11 regiões biogeográficas proposto por Ben G. Holt com um grupo de cientistas no artigo “An update of Wallace’s zoogeographic regions of the world” (Imagem retirada do livro Biogeografia de Adriano Figueiró e publicado pela Oficina de Textos)
Além da localização de um número maior de espécies de que dispunha Wallace, a atualização do mapa também levou em conta os registros de DNA dessas espécies, o que permitiu recompor relações de ancestralidade entre elas.
Qual obra ler sobre o assunto?
Esta matéria foi retirada do livro Biogeografia: dinâmicas e transformações da natureza de Adriano Figueiró, publicado pela Oficina de Textos.
Uma das áreas de conhecimento mais fascinantes, o livro trata da relação entre seres vivos, sociedade e os diferentes elementos das paisagens, suas dinâmicas e transformações ao longo do tempo.
Com essa abordagem, a Biogeografia preenche uma importante lacuna na bibliografia nacional, avançando alguns passos na construção de uma Biogeografia Brasileira.
Serve como referência para estudantes e profissionais de Geografia, Biologia, Agronomia e Ecologia e abre os horizontes ao público amplo.
Resumo desse artigo sobre regiões biogeográficas
- A biogeografia estuda a distribuição dos seres vivos e os fatores que moldam essa organização;
- As classificações evoluíram de seis regiões propostas por Sclater para até onze na atualidade;
- O Brasil apresenta domínios únicos que revelam a riqueza da biogeografia brasileira;
- A biogeografia de ilhas explica padrões de diversidade e conservação em ambientes isolados;
- As ecorregiões detalham processos locais, facilitando políticas ambientais modernas.