“É possível que barragens de rejeitos sejam cada vez menos necessárias”, afirma Arthur Chaves

Autor da coleção Teoria e Prática do Tratamento de Minérios aborda os desafios e as soluções possíveis para a disposição de barragens de rejeitos

A disposição de rejeitos, um processo que já levantava questionamentos em decorrência da utilização de grande volume de água e obtenção de aterros com pobres propriedades geotécnicas, ganhou ainda mais notoriedade depois dos últimos dois grandes acidentes envolvendo barragens de rejeitos. O rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), em 2015, e o rompimento da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), em 2019, aqueceram os debates entre pesquisadores e profissionais do setor da mineração. 

Segundo Arthur Pinto Chaves, professor do Departamento de Engenharia de Minas e de Petróleo da Escola Politécnica da USP, o setor tem envidado ainda mais esforços na busca por soluções mais sustentáveis e seguras para o problema da disposição de rejeitos. “Um assunto que está despertando muito interesse da comunidade é a pré-concentração de minérios”, ele conta.

Chaves introduz o tema no livro Bombeamento de polpa e classificação, primeiro livro da coleção Teoria e prática do Tratamento de Minérios, que ganhou recentemente sua quinta edição e está em lançamento pela editora. Veja também outra

Disponível na livraria Ofitexto!

O autor explica que é possível evitar que rejeitos de pré-concentração de minérios sejam depositados em barragens de rejeitos. Para isso, é fundamental investir na operação inicial do tratamento de minérios

“Se for viável implantar uma operação inicial com o objetivo de descartar a maior quantidade possível de minerais indesejáveis, isso irá diminuir não apenas o volume de minério destinado à usina de beneficiamento, mas também a quantidade de minério moída, o que significa reduzir o consumo energético da operação e o desgaste dos equipamentos”, esclarece o professor. 

Os principais benefícios dessa operação, destaca Chaves, incluem a economia dos custos de produção e a geração de um material descartável em uma granulometria mais grosseira. “Esse material poderá ser empilhado, estocado no ‘bota-fora’ da mina, ou usado para pavimentação, na construção civil”.

O professor aborda um caso em que isso aconteceu na operação de uma mina de cobre no Estado do Pará, onde atuou como consultor. “No primeiro momento, o cliente consultou engenheiros chilenos, que estão acostumados com um tipo de mineralização disseminado”, diz ele. “No nosso caso, a mineralização era do tipo brecha – ou seja, o minério se depositava em trincas dentro do granito”.

“O que fizemos foi britar e concentrar o produto de britagem por um método muito barato, que é a jigagem. Aquelas trincas cheias de minério separaram no produto pesado e o granito separou no produto leve. Reduzimos para 30% o volume de minérios que foi encaminhado para a usina de beneficiamento e descartamos 70% do volume de materiais indesejáveis, que poderiam ser usados para obras civis, obras de aterro, ou simplesmente dispostos em pilhas, numa economia extremamente significativa”, conta. 

Ele comenta que, além de diminuir os custos de processamento, a reserva da jazida aumentou significativamente, pois partes da jazida que eram consideradas pobres, minério marginal que não valeria a pena lavrar, foram enriquecidas e passaram a ser minérios. “Esse é o benefício da pré-concentração, que é um dos conceitos que inseri nessa nova edição do primeiro volume”, declara.

Rejeitos como subprodutos da indústria

Fala-se muito em gerar coprodutos ou subprodutos do mineral de minério. O principal desafio do setor é, no entanto, fazer o gerenciamento de um volume tão grande de produção de rejeitos. Chaves explica que há uma grande dificuldade de utilização desses subprodutos em razão da falta de interessados em adquiri-los. “Falamos sempre em destinar areia e brita para a construção civil, mas precisa haver um mercado que consiga absorver tudo isso”, diz. “Além disso, as minas normalmente ficam em localizações muito afastadas”, lembra ele. “Muitas vezes é inviável economicamente transportar essa brita ou essa areia até uma cidade para vendê-la como material para construção civil”.

Minas sem barragens de rejeitos

Outra solução possível para a questão da disposição de rejeitos é a elaboração de projetos de usinas em que barragens de rejeitos não sejam necessárias. O professor dá como exemplo uma pesquisa de autoria de Maurício Guimarães Bergerman, atualmente professor no Departamento de Engenharia de Minas e de Petróleo da USP, que foi seu aluno e orientando no curso de graduação em Engenharia de Minas.

“O professor Bergerman abordou em seu Trabalho de Conclusão de Curso, em 2005, um projeto de usina de beneficiamento com nenhum efluente”, lembra Chaves. Era uma usina de bauxita localizada na Zona da Mata mineira. O professor comenta que a bauxita era retirada também dos rejeitos, onde estava presente, mas contaminada com minerais de ferro e de titânio. 

“Separavam-se esses minerais e, no fim, sobrava apenas lama”, conta. “A partir disso, contratamos um ceramista, que fez uma pesquisa geológica nos arredores da usina e identificou uma argila bastante plástica. Descobrimos que, misturando essa argila plástica com a argila que estávamos rejeitando, teríamos material com plasticidade suficiente para fazer cerâmica vermelha, que é usada na produção de pisos e tijolos extrudados”, ressalta o professor. “Isso prova que é possível fazer uma planta com rejeito zero”. 

Nesse tipo de caso, a solução só poderia ser empregada em larga escala após profunda análise e discussão de mercado, alerta o autor. “Se formos capazes de produzir produtos cerâmicos a partir de rejeitos de argila, seria travada uma competição com toda uma indústria cerâmica que está estabelecida, o que traria desequilíbrio ao mercado. É um assunto muito sério, mas a solução é possível.”

Confira o vídeo da entrevista: