Brasil não é exemplo na segurança contra incêndios; livro procura suprir lacuna na capacitação de técnicos

Arquitetos, engenheiros civis, engenheiros hidráulicos, engenheiros elétricos: a união desses profissionais, a utilização de materiais e técnicas adequados e uma boa normatização são os ingredientes necessários para proteger uma estrutura do fogo. A explicação é do engenheiro João Paulo Correia Rodrigues, um dos principais especialistas mundiais em segurança contra incêndios.

A segurança contra incêndios nas estruturas começa pelo papel do arquiteto, ao dimensionar, no projeto, a largura de corredores, a inclinação e largura de escadas, as saídas de emergência etc.

O projeto de arquitetura é complementado pelo projeto dos sistemas de segurança contra incêndios. Entra nesse rol o sistema de chuveiros automáticos, a colocação dos extintores, os sistemas de detecção de incêndio, os sistemas de controle de fumaça. O dimensionamento desses sistemas é de responsabilidade de engenheiros. Já o engenheiro mecânico faz os cálculos dos sistemas de controle de fumaça, por exemplo. Cabe ao engenheiro elétrico a escolha dos sistemas de detecção de incêndio.

Há ainda o projeto da estrutura em si, que é feito pelo engenheiro civil. “A segurança contra incêndios da estrutura pode ser conseguida obedecendo às normas brasileiras em vigor, por meio dos cálculos adequados”, explica João Paulo Correia Rodrigues, engenheiro especializado em segurança contra incêndios e autor do livro Dimensionamento de estruturas em situação de incêndio, publicado pela Oficina de Textos.

Em termos práticos, como proteger uma estrutura do fogo?

Considerado por muitos o principal especialista mundial nesse tema, Rodrigues nomeia algumas técnicas que podem ser aplicadas para aumentar ou reforçar a resistência ao fogo nas estruturas.

Em estruturas de concreto, a técnica mais utilizada é o aumento da espessura do cobrimento das armaduras com o uso de mais concreto ou de concreto projetado. Pode-se utilizar também placas de silicato de cálcio colocadas em volta do elemento.

Já quando se trata das estruturas em aço, a proteção pode ser feita com tinta intumescente. “É um tipo de material que não altera a configuração da secção transversal do elemento”, afirma o especialista. “É um tipo de solução que os arquitetos gostam porque o elemento fica com a sua forma original. É uma tinta que tem uma aparência perfeitamente normal só que tem a particularidade de, em situação de incêndio, ela vai carbonizar e aumentar a espessura, formando uma proteção em volta do elemento”.

Ainda para as estruturas em aço, é possível utilizar também as placas de silicato de cálcio. “Podemos usar também uma técnica de argamassas projetadas de vermiculite e perlite, que é uma técnica relativamente barata quando comparada a outras técnicas. Mas é utilizada apenas quando o perfil não fica exposto, quando o elemento a ser protegido está em uma zona não visível, onde não haja problemas em relação à estética, porque a aparência final do perfil de aço protegido com essa técnica é, vamos dizer, não muito agradável”.

Há ainda a técnica de estrutura irrigada, uma técnica usada na Europa central e Austrália. Ela consiste em uma estrutura formada por perfis tubulares soldados entre si. Dentro dos perfis existe água. “Havendo incêndio, a água do perfil aquece, vai haver um movimento circulatório de convecção e a água quente vai sair da zona aquecida e vai para as zonas frias. A zona de água da fria, por sua vez, vai ocupar o lugar onde estava a água quente. É o princípio de funcionamento dos radiadores de automóveis”, explica João Paulo. Embora extremamente eficiente, essa técnica não é muito utilizada por ser mais cara.

Em relação às estruturas de madeira, cabe uma ressalva. “A madeira é um elemento que tem boa resistência ao fogo, porque é um material com baixa condutibilidade térmica”, afirma João Paulo. Mas há técnicas que podem ser aplicadas para aumentar ainda mais a resistência ao fogo. Uma delas é a utilização de tintas intumescentes ou vernizes intumescentes.

Há ainda técnicas de proteção por impregnação na madeira através de fenômenos de autoclave. “Na autoclave, podemos retirar a seiva da madeira e adicionar outros sais que aumentam a resistência da madeira em situação de incêndio, nomeadamente sais de sulfato de amônia e bórax”. Pode-se ainda reforçar a resistência aumentando a espessura da madeira, usando placas de silicato de cálcio, placas de base de gesso e muitas outras.

No caso de estruturas de alumínio, o melhor é tentar esconder a estrutura dentro de paredes ou um teto falso.

Outros sistemas de segurança contra incêndio

Quando se trata da segurança contra incêndios, além da proteção das estruturas, há sistemas de extrema importância: o sistema de detecção de incêndio, o sistema de chuveiros automáticos (ou sprinklers) e o sistema de controle de fumaça.

No Brasil, o sistema de detecção de incêndios é muito pouco usado. “Como não são exigidos, esses sistemas quase não são usados aqui”, conta João Paulo Rodrigues. “Mas são sistemas importantes, pois permitem a detecção precoce do incêndio em zonas que não têm vigilância permanente, por exemplo”.

Com o sistema de chuveiros elétricos, é possível jogar água em diferentes partes, especialmente nas chamadas redes secas, que só podem ser acessadas pelos bombeiros. “Com os sprinklers, essas zonas já começam a receber água antes mesmo da chegada do Corpo de Bombeiros”.

O sistema de controle de fumaça só é exigido no Brasil em alguns tipos de edifício. “Trata-se de um sistema fundamental”, alerta o especialista. “Temos visto que, em casos de incêndios, a maior parte das vítimas morre por inalação de fumaça. Portanto, é extremamente importante que haja a extração da fumaça de forma rápida e eficaz para evitar a perda de vidas”.

Rodrigues destaca, no entanto, que o número de técnicos especializados no dimensionamento de sistemas de controle de fumaça no Brasil está muito aquém do desejado. Segundo ele, o país conta com poucos técnicos capacitados para isso. “Deveria haver mais profissionais especializados neste dimensionamento e os sistemas de controle de fumaça deveriam ser usados de forma muito mais abrangente e mais criteriosa”.


Para saber mais

Dimensionamento de estruturas em situação de incêndio é um livro pioneiro no Brasil em tratar de patologia dessas estruturas em um capítulo sobre avaliação e reparação de estruturas danificadas.

Capa de Dimensionamento de estruturas em situação de incêndio, obra que trata de segurança contra incêndios.