Pedologia ajuda a manter os solos saudáveis e produtivos

Igo Lepsch, autor do livro “19 Lições de Pedologia”, fala sobre maximização da produção, cuidados de solos e fatores climáticos que podem afetar os cultivos.

A pedologia trabalha com o estudo científico dos solos, passando pela formação, classificação e o mapeamento para descobrir como manter a condição ideal do solo. É preciso entender como os solos se desenvolvem naturalmente, como eles são influenciados pelo ambiente e também como o ambiente os afeta.

A segunda edição do livro, 19 Lições de Pedologiade Igo Lepsch, publicada pela Editora Oficina de Textos, traz uma revisão de temas muito importantes para a Ciência do Solo, explorando desde quais os tipos de rochas encontradas na superfície terrestre até como se formam os minerais que dão origem aos solos.

O pedólogo observa todas as camadas para conhecer os fatores de formação e, assim, encontrar as melhores técnicas de conservação. As informações geradas são utilizadas nos ramos da Ciência do Solo e também são aplicadas em outras áreas como: Agronomia, Geografia, Geologia, Engenharia, Arqueologia e Biologia entre outras.

Apesar de ser uma ciência nova, antigas civilizações como os egípcios, chineses, e gregos já estudavam o solo principalmente para agricultura. Esses povos notavam que alguns solos produziam mais alimentos que outros e muitas vezes após esgotar as áreas procuravam solos mais férteis, porque não sabiam como tratar e conservar.

A seguir, uma conversa com o autor que fala sobre o solo brasileiro, como podemos conservar, o que o livro pode ajudar nesse trabalho e também um comentário sobre o PronaSolos, plataforma de informações sobre solos do mundo tropical, criado para mapear 1,3 milhão de km² do País nos primeiros 10 anos e mais de 6,9 milhões de km² até 2048.

Comunitexto (CT): Qual a importância da pedologia em um mundo que precisa produzir cada vez mais alimentos?

Igo Lepsch (IL): A maior parte dos alimentos que consumimos, direta ou indiretamente, vêm do solo. O solo é responsável também pela produção de combustível (álcool), vestuário (algodão) e fibras (para papel). Por outro lado, nem todos os solos são aptos para cultivo; em termos mundiais, estima-se que apenas perto de 30% deles podem ser cultivados. Em relação à população, estima-se que no ano 2100 teremos 10 bilhões de humanos.

Portanto, uma dura realidade do nosso século XXI é que a demanda por alimentos, fibras e combustível crescerá também em questão de milhões, mas o recurso solo para prover esses bens é limitado e encontra-se ameaçado devido à contínua e crescente degradação pela erosão e ocupação pela urbanização.

Para atender a esta crescente demanda por alimentos, teremos que pensar em aumentar a área cultivada, proteger os solos contra a erosão e usar técnicas agronômicas modernas para aumentar a produtividade, entre as quais está o uso adequado de fertilizantes, de defensivos agrícolas, variedades de plantas mais produtivas (incluindo aí os chamados transgênicos) e controle da erosão.

A pedologia, estudando os solos em seu ambiente natural, é de grande importância pois, para proteger os solos contra erosão e fazê-los mais produtivos, é necessário conhecer bem como se formam e como são constituídos.

CT: Como os fatores climáticos e externos afetam os solos?

IL: O solo é função do clima, relevo, organismos atuando sobre um determinado material de origem (normalmente uma rocha) durante certo tempo. Os fatores climáticos são tidos como dos mais importantes na formação de um solo. Por exemplo, em regiões tropicais úmidas, a água da chuva e o calor do sol atuam sobre o material de origem, fazendo com que se desenvolvam solos muito profundos.

CT: E como o uso de químicos afeta o solo? Como trabalhar essa questão?

IL: Os produtos químicos, tanto fertilizantes como os defensivos, são indispensáveis para obter maiores produtividades, contudo, devem ser usados com cautela e nos tipos e nas quantidades mais adequadas, considerando os atributos do solo e do cultivo. Para isso, é necessário conhecer o solo usando as recomendações dos agrônomos.

CT: No Brasil se fala muito “em se plantando tudo dá”. Isso se deve à qualidade e variedade de solos que temos?

IL: Falamos muito que, no Brasil, “em se plantando tudo dá”, mas é preciso acrescentar que se deve plantar conhecendo a aptidão dos solos e fazendo uso das modernas práticas agronômicas.

CT: O Brasil tem cuidado do seu solo corretamente? Ainda temos o que melhorar?

IL: Infelizmente, em muitas áreas o solo não é usado corretamente, principalmente no que diz respeito às práticas de conservação do solo.

CT: Quais são os principais pontos abordados no livro que podem ajudar a manter os solos brasileiros?

IL: Nos primeiros capítulos do livro são abordados mais aspectos mineralógicos, físicos, químicos e morfológicos do solo, importantes para conhecer o objeto de estudo. As partes mais aplicadas, que ensinam como manter a qualidade dos solos, estão nos capítulos referentes à análise da fração sólida do solo e o último capítulo intitulado “Degradação e conservação dos solos”.

CT: No Brasil, os biomas Pampa, Cerrado, Amazônia, cada um tem suas peculiaridades?

IL: Sim, Pampa, Amazônia e Cerrado têm climas diferentes e, por isso, têm peculiaridades distintas.

Nos Pampas predominam planícies com solos onde a parte superficial é escura e são naturalmente bastante férteis em bases, enquanto que na Amazônia a maioria dos solos é amarelada e também pouco fértil, mas ostenta a pujante floresta amazônica devido ao clima bastante úmido.

Já no Cerrado, predominam as chapadas com Latossolos que são muito espessos e pouco férteis, mas com boas propriedades físicas, fazendo com que, se devidamente adubados, produzam muitos cultivos.

CT: Quanto ao conhecimento do solo, qual é sua visão sobre o Programa PronaSolos, uma Plataforma de informações sobre solos do mundo tropical, e como essa proposta pode contribuir?

IL: O PronaSolos é um programa nacional, mas eu estranhei algumas coisas: primeiro que eles não mencionam nada a respeito de séries de solos. As séries, em vários países do mundo, são uma base para planejamento da agricultura e tudo mais. Parece que há uma tendência de estabelecer primeiro série e comunidade taxonômica para depois a série e comunidade de mapeamento.

Acho que o programa deveria ser baseado em mapas municipais e que as séries de solos pudessem ser colocadas lá; o nome popular do solo é que é mais útil para os agricultores, engenheiros civis etc. tomarem suas decisões. Mapas de solos são muito úteis para a recuperação de áreas degradadas.

CT: Como a formação teórica dos pedólogos pode influenciar os mapeamentos digitais ou convencionais? O conhecimento tácito, definido como empírico, não é muito dependente disso?
E os mapeadores digitais? Como fazem sem essa formação teórica sólida em pedologia, geologia e geomorfologia?

IL: O que tem faltado para os pedólogos é a geomorfologia, cursos sobre esta área. Apesar de sabermos que o mapa é usado para ler as terras e que é lendo que a gente pode mapear, apesar da base, a ciência que descreve a superfície da terra e a sua origem é a geomorfologia.

Infelizmente não é uma disciplina que é dada nos cursos de agronomia, e por vezes as escolas de agronomia não têm o curso de geociências, para que os pedólogos possam fazer esse curso de geomorfologia. Assim, a base teórica é muito importante.

É essencial fazer um levantamento com base em três pontos: observações diretas, que é o trabalho de campo; observações indiretas, o modelo de observação de paisagens, fotografias aéreas etc.; e os conhecimentos teóricos que a pessoa adquire em um curso de pedologia.

Isso é o que meu livro apresenta para os cursos de graduação, 19 lições de pedologia. Quando não se tem essa base, leva-se muito mais tempo, além do levantamento não ser tão preciso.

CT: Muitas ordens de solo possuem seus horizontes diagnósticos em subsuperfície. Como o mapeamento digital de solos pode investigar a presença desses horizontes diagnósticos em subsuperfícies?

IL: O mapeamento digital não é feito só pelo computador ou em um escritório. A gente também vai ao campo, abrimos trincheiras e identificamos os solos. O que o mapeamento digital faz é o delineamento, a linha de separação de um tipo de solo de outro. A abertura de perfis, análise de laboratório e descrição dos horizontes de superfície e de subsuperfície – tudo isso deve ser feito.

Da mesma forma se faz para o levantamento tradicional. É algo bem comum, às vezes,  as pessoas pensarem que levantamento digital não envolve trabalho de campo. Sim, ele envolve o trabalho de campo.

A identificação das unidades é feita no campo, então a resposta é: os horizontes de subsuperfície têm que ser expostos, descritos e analisados, para que o levantamento seja feito.

CT: E o levantamento de solos nos EUA?

IL: Começaram a mapear há cem anos. Alguns anos atrás, começaram a usar o levantamento digital. O município de Essex foi um dos primeiros. Então, o que eu acho mais interessante, comparando com os nossos levantamentos, é que o Estado investe para que esses levantamentos sejam feitos e apresentados ao público. Antes, os relatórios vinham impressos, agora tudo pode ser acessado pela internet.

Os solos são identificados pelas séries, então as séries têm os seus nomes populares, e isso faz com que seja melhor para os usuários. Os pedólogos têm um treinamento especial e eles, nos primeiros anos de trabalho, mapeiam junto com outros colegas mais experientes, então é a experiência de cem anos de levantamentos detalhados. Enquanto isso, nós estamos apenas começando, aqui no Brasil. E eu acredito que nós podemos seguir esse exemplo deles, porque está dando certo.

CT: Qual o recado para quem trabalha com solo no Brasil?

IL: O recado seria: procure conhecer bem o solo; consulte um pedólogo que poderá informar quais tipos de solo existem em sua propriedade, e como eles devem ser manejados para obter boas produtividades sem desgastá-lo pela erosão das chuvas.

Igo F. Lepsch é renomado especialista em Solos, com Mestrado e PhD pela North Carolina State University, EUA, e pós-doutorado na Commonwealth Scientific Industrial Research Organization, Austrália. É autor de inúmeros artigos científicos e de divulgação publicados em 45 anos de atividade profissional.

Após atuar como pesquisador no Instituto Agronômico de Campinas, vem atuando como professor visitante e consultor de empresas. Pela Oficina de Textos, publicou também Formação e Conservação dos Solos.

Saiba mais sobre pedologia dos solos

Em 19 lições de Pedologia, aborda-se a evolução na análise e classificação dos solos, além da descrição dos principais sistemas modernos de classificação, seus fundamentos e suas diferenças, com destaque para o Sistema Brasileiro de Classificação dos Solos. Um livro-texto fundamental para os cursos de graduação em Agronomia, Florestas, Ecologia, Zootecnia, Geografia e Biologia, entre outros.

O objetivo é levar informações para professores, estudantes e profissionais de diversos ramos afins, sobre a variedade de solos brasileiros existentes. São utilizados conceitos como granulometria, densidade, porosidade e ar do solo para entender o comportamento dos solos em ecossistemas naturais e alterados pelo homem.

Nesta 2ª edição da obra sobre a pedologia dos solos, foi realizada uma ampla revisão de todos os capítulos, especialmente os relativos aos levantamentos de solos e às análises químicas destes. Foram adicionadas questões para estudo e um novo glossário de termos de Ciência do Solo.

Confira a degustação da obra aqui.

Capa do livro “19 lições de pedologia”, publicação da Editora Oficina de Textos

Capa do livro “19 lições de pedologia”, publicação da Editora Oficina de Textos