Ciências do Ambiente: entrevista com Regina Pacca Costa

Ciências do Ambiente é uma das disciplinas que compõem a grade curricular de cursos como Engenharia Ambiental e Hidráulica e Saneamento. Dialogando de maneira muito próxima com outras cadeiras dessas e outras formações técnicas e superiores, aborda amplamente diversos conceitos fundamentais para o aprendizado nessas áreas. 

Atuando há mais de 40 anos como professora no curso de Hidráulica e Saneamento, da Faculdade de Tecnologia de São Paulo (Fatec/SP), Regina Pacca Costa ministra aulas da disciplina de Ciências do Ambiente e esse mês publicou, pela livraria técnica Oficina de Textos, obra que recebe o mesmo nome. 

Ao Comunitexto, Regina Pacca Costa fala sobre suas principais motivações para desenvolver o livro e ainda aborda a importância de contar com a disciplina de Ciências do Ambiente no currículo dos cursos de ensino superior. Confira!

Foto de uma gota d'água pousada em uma folha verde.

Levar a compreensão sobre a ecologia é uma das premissas do livro de Regina Pacca Costa. Fonte: Aaron Burden/Unsplash

Comunitexto (CT): Qual foi a motivação para desenvolver o livro Ciências do ambiente?

Regina Pacca Costa (RPC): Já faz 41 anos que ministro aulas na Fatec/SP nas áreas de saneamento e ambiental. Gosto muito de pesquisar, costumo dizer que sou pesquisadora e professora desde que nasci (risos).

Também adoro livros… Confesso que, lá no início de minha carreira, nunca pensei que fosse virar escritora, mas esta minha mania de pesquisar acabou me direcionando para a edição de livros técnicos.

Como uma das disciplinas que ministro aula tem o nome de Ciências do Ambiente, iniciei minha pesquisa com o objetivo de montar uma apostila, pois os alunos perguntavam se eu não tinha um material impresso para que eles pudessem acompanhar.

De fato, o conteúdo programático da disciplina é muito amplo, pois tem o objetivo de “introduzir” o aluno no conceito da engenharia sanitária e ambiental. Dessa forma, mesmo tendo o foco de ensinar os conceitos básicos de cada setor desta área, o material somou um volume considerável para ser editado um livro.

Aparelho de medição hidráulica.

A disciplina de Ciências do Ambiente está presente em diversos cursos superiores, inclusive Hidráulica e Saneamento. Fonte: Ivan Bandura/Unsplash

Vale destacar que, no curso de Hidráulica e Saneamento, onde sou professora e responsável pela cadeira Ciências do Ambiente, cada assunto abordado é desmembrado e discutido minuciosamente em uma ou mais disciplinas.

Porém, essa disciplina é considerada obrigatória em vários outros cursos na área da engenharia e em outras áreas que dissertam, ou buscam dissertar, um resumo da importância da gestão ambiental. Por exemplo, já ministrei aulas dessa disciplina no curso de Turismo, já apresentei palestras em escolas técnicas (ETECs), escolas de ensino médio e até fundamental.

Também já ministrei palestras em órgãos ligados à área de abrangência do livro, por exemplo, na Sabesp e em eventos e congressos.

CT: Quais são os principais destaques do livro?

RPC: Neste livro, procurei escrever uma sequência de assuntos montados de acordo com o conteúdo programático da cadeira de Ciências do Ambiente. Assim, fica mais fácil de entender e acompanhar o desenvolvimento do raciocínio proposto na disciplina.

Costumo dizer que montei um “raciocínio lógico” para favorecer a compreensão e a importância dos assuntos abordados, de forma crescente na importância técnica e no aprofundamento textual.

Inicialmente, meu discurso é o da importância da Educação Ambiental, mesmo porque ela reflete as ações e culturas de uma população e, a partir do momento em que a população não valoriza o meio ambiente, não consegue reconhecer a sustentabilidade e o desenvolvimento sustentável como único eixo fundamental para a melhora da qualidade de vida. Ou seja: EDUCAÇÃO + Respeito com a casa (meio ambiente) = desenvolvimento saudável e produtivo (= desenvolvimento planejado e sustentável).

Como segundo assunto, acho importante reconhecer o inter-relacionamento fundamental que existe entre as espécies vivas do planeta e o meio em que elas compartilham. Ou seja: a Ecologia. É importante entender como funciona nossa casa (o planeta) e qual o reflexo dessas atividades em nossa qualidade de vida, assim como na economia, no social e na política.

Como terceiro assunto, destaco a importância sublime das águas. Sem ela não existiria nem planeta Terra e nem os seres humanos para poder, em sua prepotência, tentar controlar todas as ações do planeta.

Foto de uma criança bebendo água de um copo.

A água é um bem precioso sem o qual a vida não é possível. Fonte: Johnny Mcclung/Unsplash

Como um fluido vital, é importante que se saiba cuidar, valorizar e proporcionar sustentabilidade à água, que é considerada a essência da vida na Terra, pois, sem ela, não teríamos como viver, plantar, criar animais etc. Levanto a discussão das dependências industrial e agropecuária, no lazer no trabalho e na vida em geral, e seu reflexo no desenvolvimento social, econômico e político de uma região. Nas próximas abordagens do livro, direciono para a gestão ambiental e do saneamento.

Sendo assim, começo explorando a parte conceitual do abastecimento público de água potável; do sistema de esgotamento sanitário envolvendo os tipos de tratamentos de esgoto; da necessidade da gestão dos resíduos sólidos e de um bom sistema de drenagem urbana. E, por fim, falo da gestão dos grandes impactos promovidos pelos poluentes atmosféricos.

CT: A que público o livro se destina?

RPC: Como disse, sou professora “de alma”, sendo assim, normalmente procuro escrever de forma simplificada e clara, para que todos possam entender o assunto, seja para condições profissionais, educacionais ou mesmo para satisfazer curiosidades.

Registrei informações suficientes para iniciar um profissional na área da engenharia e meio ambiente, como também para satisfazer a necessidade informativa para a vivência da população convencional, quero dizer, para as pessoas que não são necessariamente da área técnica, mas querem ou precisam conhecer melhor o assunto. 

Vale considerar que o estudo do meio ambiente atualmente é considerado como uma área “multidisciplinar”.

CT: Qual a contribuição da obra para o meio científico na área?

RPC: Como disse anteriormente, o estudo do meio ambiente é considerado multidisciplinar e, sendo assim, ele afeta diretamente a qualidade de vida de toda a população seja no Brasil ou em qualquer país desse mundão de Meu Deus (risos). Pode-se dizer que, atualmente, os cuidados ambientais regem 100% a vida do ser humano, mesmo que ele ainda não consiga reconhecer exatamente esse conceito.

O meio em que vive cada cidadão reflete as condições e/ou viabilização da economia, da saúde, da vida social política e administrativa, uma vez que rege suas indústrias, seu comércio, o uso “e desuso” de suas ações e produtos,  a produção e/ou controle de seus impactos etc.

CT: Discorra sobre a “espinha dorsal” das ciências ambientais.

RPC: Na minha opinião, a espinha dorsal das ciências ambientais está diretamente ligada e fundamentada na educação ambiental. Quando se fala em educação ambiental, aliás, tirando o ambiental e falando só em educação, verifica-se a grande lacuna que tem entre o seu comportamento, a aceitação de alguma coisa e a amplitude da tecnologia.

Ou seja, você pode ter a tecnologia que for, você pode ter a lei que for, você pode ter o respaldo que for, se você não tiver o comportamento adequado, nada disso vai funcionar. Então você pode ter lixeira, por exemplo, em cada esquina, mas se as pessoas não jogarem o lixo na lixeira, não vai resolver. 

Quando se fala de educação ambiental, fala-se que é necessário que as pessoas tenham informações diárias e constantes sempre: não é uma campanha que teve sucesso e parou. A campanha, para ter sucesso, tem que existir e ter uma continuidade, porque com a continuidade dessa campanha você acaba levando essa informação à cabeça das pessoas. As pessoas assimilam isso, entendem essa informação e, a partir do momento que te traz consciência, você começa a mudar o comportamento e, então, você passa a ter a habilidade. 

Isso se fala muito com referência à educação ambiental, mas eu diria que isso é para qualquer coisa, então, se eu lanço uma megatecnologia, se você não souber usar, ela não servirá para nada. O conceito do ambiental tem intrínseca importância, você entender o meio ambiente, a sua casa como o formador de um todo, vai da cabeça das pessoas, da população. Dessa forma, elas têm que parar de impactar, têm que buscar situações sustentáveis, têm que aceitar o comportamento implementado dentro de uma cartilha ou dentro das próprias normas. 

Pessoa com luvas de borracha recolhendo lixo do chão e jogando em um saco plástico preto.

Educação ambiental tem a ver com mudança de cultura e comportamento. Fonte: Jeremy Bezanger/Unsplash

O brasileiro tem um problema seríssimo, cultural, que são dois ditados que eu costumo chamar a atenção em aula. Um deles é “o mundo é dos espertos”, que faz com que as pessoas façam o que tiver de fazer, porque, se não, o outro vem e faz. Isso para mim é um câncer social, a coisa mais errada do mundo. Esperto é aquele que respeita a todos. E, respeitando o sistema e respeitando a todos, o sistema anda. 

E outro ditado: “não se mexe em time que está ganhando”. Absurdo absoluto, uma vez que tudo é muito dinâmico, tudo está se alterando em cada momento e, se você não se alterar, se você não se atualizar, se você não modificar sua forma de pensamento, se você não se der ao direito de recolocar os seus certos, os seus coerentes, repensar o seu entendimento, você fica obsoleto.

Na minha opinião, a coluna dorsal de qualquer evolução é a educação. E, se nós estamos ligando ao meio ambiente, é a educação ambiental. Aí você impacta menos, você gerencia mais, você produz mais e você melhora a qualidade de vida. 

CT: Qual a importância dessa disciplina na grade curricular dos cursos superiores?

RPC: Essa disciplina tem o objetivo de introduzir a filosofia, vamos dizer assim, porque a educação ambiental eu acho que é uma filosofia de vida, a pessoa tem que ter. Se ela não tem ações diretas com as coisas, ela tem ações comportamentais, como falei na resposta anterior. 

Atualmente, é uma disciplina considerada pertencente ao ensino geral; antigamente, era exclusiva do ensino técnico. Ela é multidisciplinar, portanto obrigatória em todos os cursos de engenharia, e está sendo implementada em outras formações para dar o contexto geral da engenharia ambiental. Por mais que a pessoa não vá necessariamente trabalhar com meio ambiente, ela sempre atuará sob ele.

Por exemplo, a gente certifica muito, certifica o ISO 9.000, o ISO 14.000, essas coisas. Então, quando você vai certificar ou vai auditar uma empresa, por exemplo, automobilística, você vai fazer com que o processo dela seja ambientalmente correto, para evitar impactos, para ter aproveitamentos econômicos, ter reciclagens e comportamentos que te tragam retorno financeiro.

As empresas particulares têm esses ganhos financeiros, mas, até aí, você consegue provar que está trabalhando em harmonia com o meio ambiente, ele acaba te dando um respaldo social, econômico e financeiro. 

A gente normatiza bastante o automobilístico, por exemplo, que, a princípio, não teria a ver com meio ambiente, mas na verdade tem sim, porque eles são produtores e causadores de pretensos impactos. Se eles gerenciam isso, eles têm uma cadeia produtiva limpa. Assim, a importância dessa disciplina é introduzir os fundamentos da educação ambiental em toda e qualquer área, uma vez que ela é multidisciplinar.

Saiba mais sobre Ciências do ambiente

Trazendo diversas ilustrações e exemplos práticos a respeito da aplicação do conhecimento sobre as ciências ambientais, Ciências do ambiente é uma obra que contempla públicos diversos, da mesma forma como a disciplina homônima busca atender a estudantes de variados cursos superiores. 

A obra oferece contexto histórico e, com linguagem didática, explica as legislações relacionadas ao meio ambiente e de que forma as organizações e o setor público podem contribuir com a manutenção dos ecossistemas e da nossa casa, o planeta Terra.

O livro traz ainda um panorama da história da educação ambiental no Brasil com todos os eventos que marcaram seu estabelecimento e desenvolvimento até hoje. 

Capa de Ciências do ambiente.

A obra está disponível para aquisição na livraria técnica Ofitexto na versão impressa.