Arthur Pinto Chaves fala sobre o tratamento de minérios

O esgotamento das jazidas de minérios ricos e fáceis de trabalhar faz com que a tecnologia de tratamento adquira uma importância cada vez maior entre todas as áreas da mineração. É o que afirma o professor do Departamento de Engenharia de Minas e de Petróleo da USP, Arthur Pinto Chaves, autor da coleção Teoria e Prática do Tratamento de Minérios.

A Oficina de Textos entrevistou o autor e abordou temas como a situação da mineração no Brasil, os problemas do ensino e, claro, a sua obra Teoria e Prática do Tratamento de Minérios.

O desconhecimento do grande público em relação à mineração, a escassez de profissionais, a ganância dos governos e o preconceito dos problemas que essa atividade poderia causar no meio ambiente são as principais dificuldades das empresas mineradoras que atuam no Brasil. Tudo isso é um ciclo que, em uma visão distorcida, constantemente divulgada pela mídia, faz com que haja poucos interessados na área, o que também se reflete nas políticas ambientais e dificuldades com prazos de licenciamento.

Apesar disso, ele acredita que a engenharia mineral brasileira é uma engenharia “de ponta”, com excelentes escolas e equipamentos de padrão internacional, além de possuir companhias que estão entre as melhores do mundo.

Acompanhe abaixo a primeira parte* da entrevista com Arthur Pinto Chaves:

Comunitexto (CT): Podemos afirmar que o tratamento de minérios é um dos ramos mais importantes dentro da engenharia de minas?

Arthur Pinto Chaves (APC): A Engenharia de Minas possui duas áreas principais: a Extração ou Lavra do Minério e o Tratamento de Minérios. Alguns incluem também a Geologia de Mineração, mas eu, pessoalmente, acho que ela é melhor desempenhada por bons geólogos.

No desenvolvimento duma mina, as três áreas se complementam e, sem qualquer uma delas, todo o ciclo fracassa. Entretanto, o esgotamento das jazidas de minérios ricos e fáceis de trabalhar faz com que a tecnologia de Tratamento adquira uma importância cada vez maior.

CT: De todas as etapas do tratamento de minérios, qual a mais complicada? Qual delas demanda maior conhecimento?

APC: Nós, tratamentistas, gostamos de dizer que o tratamento é uma arte, porque não se limita ao conhecimento técnico mas exige muita sensibilidade e até mesmo uma certa dose de intuição. Sob esse ponto de vista, todas as áreas são complexas. A flotação costuma ser encarada como a mais complicada porque exige conhecimentos de Termodinâmica e de Cinética que não são de domínio de todos, mas a moagem, por exemplo, dispõe de modelos de simulação de processo de alta complexidade matemática.

O importante é a visão de conjunto e o conhecimento das peculiaridades das matérias-primas minerais. Eu vejo muitas vezes colegas de formação química que querem ver o Tratamento como uma série de operações unitárias de processo químico – o que não são! – e que por isso cometem erros grosseiros de avaliação.

CT: Hoje, qual a maior dificuldade das empresas mineradoras que atuam no Brasil?

APC: As dificuldades são várias:
1) O desconhecimento do grande público em relação à mineração e a visão distorcida que é transmitida pelos meios de comunicação.
2) A escassez de profissionais. Como decorrência do problema anterior, o número da alunos é muito pequeno e não atende à demanda de profissionais.
3) A ganância dos governos federal, estadual e municipal, que veem a atividade mineral apenas como uma fonte aparentemente inesgotável de fundos. Por exemplo, a CFEM é um imposto criado para cobrar royalties das empresas de mineração. O decreto que a regula é totalmente equivocado e inclui operações metalúrgicas como calcinação e lixiviação dentro do escopo do tratamento, com a única intenção de agregar valor ao fato gerador do imposto.
4) O preconceito mencionado no primeiro item se reflete na política ambiental e nas dificuldades e prazos de licenciamento.

CT: O que, na opinião do senhor, precisaria ser aprimorado na atividade mineradora do País?

APC: A engenharia mineral brasileira é uma engenharia de ponta. Temos excelentes escolas que formam excelentes técnicos, fabricamos equipamentos de padrão internacional e temos companhias de engenharia que se situam entre as melhores do mundo. Falta amor próprio e é preciso melhorar a imagem da atividade frente à população.

CT: O Brasil importa muita tecnologia na área?

APC: Infelizmente sim. Em parte porque a evolução tecnológica acontece em todo o mundo e de maneira muito rápida. Em parte porque a nossa universidade está muito afastada da realidade industrial – a mesma mentalidade que impede a presença da PM no campus da USP decreta que fazer trabalhos em parceria com a indústria é prostituir a universidade. No limite eles querem que ninguém trabalhe, que os professores de cirurgia não operem, apenas deem aula! Com isso, a parceria entre empresa e universidade, que é o grande motor do desenvolvimento em todo o mundo, fica emperrada.

CT: Se sim, o que falta ao nosso País?

APC: Falta honestidade, vergonha e coragem. Falta sentimento cívico.

C: Hoje as práticas de tratamento de minérios são menos agressivas ao meio ambiente? O que mudou ao longo dos anos?

APC: Eu dou como leitura obrigatória para os meus alunos um paper do saudoso Prof. Joaquim Maia (UFOP), de 1972, ou seja, de quase 40 anos atrás. Ele escreveu sobre o conteúdo ético da mineração, do qual o meio ambiente é um dos aspectos. Por ele, verifica-se que a preocupação da mineração com o meio ambiente sempre existiu para os bons profissionais e para as empresas responsáveis.

A grande mudança foi a pressão da opinião pública e, no reboque desta, das autoridades, sobre os maus profissionais e sobre as empresas irresponsáveis. Infelizmente, por questões ideológicas, por falta de estrutura, ou por mera irresponsabilidade, o governo não é capaz de cobrar o estrago feito pela atividade garimpeira, que é o grande predador ambiental.

A sua pergunta também mostra o viés da opinião pública contra a mineração. Na Constituição de 1988, a única atividade industrial citada é a mineração, três vezes, no capítulo sobre meio ambiente. Atividades muito mais agressivas, como cortumesindústrias químicas ou a própria agricultura intensiva (pesticidas e fertilizantes solúveis) não são lembradas.

*Veja aqui a continuação da entrevista!


Sobre a coleção Teoria e Prática do Tratamento de Minérios

Resultado de mais de 35 anos de ensino na USP, a coleção Teoria e Prática do Tratamento de Minérios, de Arthur Pinto Chaves, parte dessa premissa e amplifica o espectro de conhecimento, fugindo da abordagem exclusivamente teórica. Em suas 1.600 páginas, divididas em cinco volumes, há uma preocupação constante com os aspectos técnicos e operacionais. São apresentadas noções gerais de mineração, além de práticas em desaguamento, espessamento, filtragem, flotação no Brasil, manuseio de sólidos granulados, britagem, peneiramento e moagem. Constantemente aprimorada a cada nova edição, a coleção é indicada a estudantes de Engenharia de Minas e Metalúrgica e profissionais da área.

Capas dos seis volumes da coleção Teoria e Prática do Tratamento de Minérios, organizada por Arthur Pinto Chaves.