“Não existe uma única avaliação de impacto cumulativo”, diz Luis Enrique Sánchez

Autor de Avaliação de impacto ambiental fala sobre a avaliação de impactos cumulativos em nova obra publicada pela Ofitexto

Impactos cumulativos resultam de um conjunto de ações humanas, inclusive aquelas que causam impacto mínimo individualmente. Por exemplo, as usinas térmicas a carvão, algumas das maiores fontes de emissão de gases de efeito estufa no mundo, individualmente emitem uma pequena fração da quantidade de gás carbônico lançada à atmosfera. Porém, com o contínuo aumento das emissões por uma imensa quantidade de fontes, veiculares, incêndios naturais e provocados, industriais e outros, acaba alterando o ciclo do carbono, gerando impactos cumulativos de efeito global, como as mudanças climáticas.

No contexto atual, em que catástrofes climáticas mostram-se mais e mais devastadoras, é preciso avaliar os impactos de projetos e planos de forma cumulativa, para que se possa evitar seu agravamento e, consequentemente, novas tragédias. O professor Luis Enrique Sánchez falou com o Comunitexto sobre a importância da avaliação de impactos cumulativos nesse cenário atual. Confira!


Comunitexto (CT): Qual a importância da avaliação de impactos cumulativos no atual cenário de intensificação de mudanças climáticas?

Luis Enrique Sánchez (LES): A importância e a contribuição da avaliação de impactos cumulativos têm crescido no contexto das mudanças climáticas. Há pelo menos dois motivos para isso. Em primeiro lugar, a sustentabilidade de componentes ambientais que podem ser cumulativamente afetados por projetos ou planos também é influenciada por mudanças climáticas. Por exemplo, se determinamos que um projeto pode afetar hábitats de espécies ameaçadas, é provável que esses hábitats também sofram pressão das mudanças do clima. Então, as mudanças climáticas podem ser tão indutoras de impactos quanto as atividades de um projeto ou de um grupo de projetos.

Há um segundo aspecto que precisará ser tratado. Em quase todo o planeta serão necessárias medidas de adaptação às mudanças climáticas. Poderá ser necessário realizar intervenções, como obras de proteção costeira, ampliação da capacidade de escoamento de estruturas hidráulicas como barragens, e soluções inovadoras em ambiente urbano. Serão intervenções que causarão impactos cumulativos, os quais deverão ser devidamente avaliados.

Foto aérea da zona a jusante de uma barragem de rejeitos em Minas Gerais, com diversas casas cercadas de vegetação. Montanhas ao fundo.

Zona a jusante de uma barragem de rejeitos em Minas Gerais 

CT: A avaliação de impactos cumulativos pode ter várias abrangências: como estudo de impactos das atividades de um único projeto, como parte de um estudo de impacto ambiental (EIA) de um projeto ou então como parte de uma avaliação de vários projetos em escala regional. Cada abordagem demanda um tipo diferente de planejamento? Como funciona esse processo?

LES: Procuro explicar no livro que não existe uma única avaliação de impacto cumulativo. O que se tem observado em âmbito internacional é justamente essa gama de aplicações. A avaliação de impactos cumulativos como parte de um estudo de impacto ambiental é bem estabelecida nos Estados Unidos e no Canadá. No final de abril foi publicada nova regulamentação sobre avaliação de impactos nos Estados Unidos, e a necessidade de que sejam avaliados os impactos cumulativos foi reforçada. Acabo de retornar do congresso da Associação Internacional de Avaliação de Impactos e vi trabalhos sobre avaliação de impactos cumulativos em âmbito regional. A abrangência de um estudo sobre impactos cumulativos é determinada quando se planeja a avaliação e quando sua finalidade é estabelecida. É a finalidade da avaliação que vai determinar sua abrangência.

CT: E quando se trata de um projeto pioneiro, isto é, o primeiro projeto de uma região? Como uma avaliação de impactos cumulativos deve abordar esse tipo de projeto?

LES: Essa é uma questão fundamental no Brasil. Projetos de infraestrutura, de energia e de mineração de grande porte têm potencial transformador e causam impactos em escala regional. A prática burocratizada de avaliação de impactos e licenciamento só é capaz de enxergar e, em certa medida, mitigar os impactos diretos. Há muita dificuldade de abordar impactos indiretos e cumulativos. Rodovias na Amazônia e perfuração exploratória de óleo e gás na Foz do Amazonas são exemplos de projetos pioneiros cujos impactos não costumam ser avaliados de forma completa no licenciamento. Para avaliar projetos pioneiros, é preciso usar um enfoque regional e incluir outros projetos e ações que poderão ser induzidos ou facilitados pelo projeto pioneiro.

CT: Qual a importância da consulta pública em uma avaliação de impactos cumulativos?

LES: A consulta aqui é tão importante quanto em outras formas de avaliação de impactos, mas é mais desafiadora: nas audiências públicas para fins de licenciamento, nos habituamos a questionar os impactos de um único projeto, ao passo que em avaliação de impactos cumulativos trabalhamos com múltiplas fontes de impactos e, muitas vezes, com vários projetos. Um exemplo do desafio é o seguinte: todos os manuais recomendam que uma avaliação de impactos cumulativos seja limitada a um pequeno número de componentes ambientais e sociais e que a escolha dos componentes seja feita com base em critérios técnicos defensáveis e nas preocupações das partes interessadas relevantes. A maneira de fazer isso é mediante engajamento precoce das partes interessadas desde o planejamento da avaliação de impactos.


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Capa de Avaliação de impacto cumulativo, de Luis Enrique Sánchez

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