A divisão territorial brasileira voltou a ser um assunto de destaque na mídia após a aprovação de um plebiscito que pode dividir o atual Estado do Pará em três partes: Pará (com território reduzido), Carajás e Tapajós.
Partindo dessa possível divisão, José Donizete Cazzolato propõe uma discussão em Novos Estados e a divisão territorial do Brasil: uma visão geográfica e analisa a atual divisão territorial brasileira e possíveis mudanças, focando os aspectos geográficos, econômicos e políticos.
Comunitexto (CT): De onde surgiu a ideia de editar um livro sobre divisões de Estados?
José Donizete Cazzolato (JDC): Eu venho me dedicando às questões territoriais faz algum tempo. Na dissertação de mestrado, em 2005, foquei a escala local, apostando na ideia dos bairros como instância territorial oficial. Dois anos depois, apresentei um texto sobre a divisão macrorregional do País, propondo uma discussão nacional para atualizar o atual arranjo, que, além de ter sido instituído em 1969, descaracterizou-se com a criação de Tocantins, em 1988, e sua inserção na Região Norte.
CT: O Pará pode ser dividido em três partes. Você acha que essa divisão pode ser benéfica para as áreas mais afastadas da atual capital, Belém?
JDC: Sim, pode ser benéfica para as três partes resultantes. O que “pega”, no caso do Pará, além da grande extensão do Estado, é sua organização espacial, que define três nódulos regionais em posições bastante destacadas: Belém, no extremo nordeste; Santarém, a oeste; e Marabá, a sudeste. A porção central do Estado, onde idealmente se localizam as capitais, é uma interface regional. Com a divisão, oficializa-se o que a geografia demonstra.
CT: Em um passado recente houve duas divisões de estados brasileiros: Mato Grosso, em 1977, foi dividido em dois com a criação do Mato Grosso do Sul; Goiás, em 1989, transformou-se em dois com a criação do Estado do Tocantins. Essas divisões foram benéficas para todos os envolvidos? Houve alguma consulta popular, como irá ocorrer no caso paraense?
JDC: Não tenho elementos para afirmar que a divisão de Mato Grosso e de Goiás foram benéficas, mas as evidências apontam que sim. Conheço razoavelmente Campo Grande, e, pelo que se observa ali, seria impensável o território sulmatogrossense tributário da distante Cuiabá. Em nenhum dos dois casos houve consulta popular.
Esta é, por sinal, uma das questões abordadas no livro. De um modo geral, essas implementações são vistas como despesas, enquanto muitas pessoas preferem considerá-las como investimento. Há que se ponderar cada caso, e por isso insisto na questão dos parâmetros técnicos. Se adotarmos um padrão territorial, aos moldes do proposto, essa questão estará embutida.
CT: Há outros projetos de divisão de Estados brasileiros em trâmite na Câmara dos Deputados ou no Senado? Quais são?
JDC: No levantamento feito, seriam 30, inclusive Carajás e Tapajós. Mas é difícil saber exatamente, porque muitos são apresentados em duplicata, outros se superpõem territorialmente, e mesmo rejeitados, quase todos são reapresentados na legislatura seguinte. Carajás e Tapajós, que vão a plebiscito este ano, eram proposições arquivadas em 2008, como se vê na pesquisa de Rogério Boueri (IPEA).
CT: Estados com grandes extensões territoriais ou mesmo com grande população são mais passíveis de divisão. Há, por parte do senhor, alguma sugestão de divisão do Estado de São Paulo, por exemplo? Como ela se daria?
JDC: Sim. A aplicação do padrão territorial proposto sugere a divisão do Estado de São Paulo. Tramitam (ou tramitaram recentemente) no Congresso dois projetos de fragmentação do território paulista, um separando aproximadamente a região Mogiana, e outro a região de Sorocaba mais o Vale do Ribeira. Parece mais coerente, geograficamente, contemplar a grande divisão que se observa no Estado, inclusive identitária, separando São Paulo propriamente e o interior. A proposta vai nessa linha.
CT: Em relação a Estados muito pequenos e com poucos recursos, seria interessante a anexação deles a outro Estado?
JDC: Sim, esse ponto eu procuro destacar, lembrando a proposta de André Martin, um dos grandes geógrafos da atualidade. Ele apresentou, em 1993, a ideia de fundir Estados, na contramão da maioria das propostas. O debate sobre a divisão territorial do País não pode deixar de considerar essa possibilidade.
CT: Para finalizar, poderão ocorrer em médio ou longo prazo novas divisões estaduais no Brasil?
JDC: Considerando-se a ausência de parâmetros ou critérios técnicos no texto constitucional, que permitiriam manter o desejável equilíbrio federativo, tudo parece possível, porque a questão acaba se resumindo apenas à instância política.
José Donizete Cazzolato é geógrafo pela Universidade de São Paulo. Possui vasta experiência em cartografia e geoprocessamento, tendo vivenciado a migração dos processos para o meio digital. Desenvolveu particular interesse pelas estruturas territoriais (divisão político-administrativa) e pela toponímia. Atuou decisivamente na divisão distrital do município de São Paulo (Lei nº 11.220/92) e apresentou, na dissertação de mestrado (2005), metodologia para divisão dos grandes municípios em bairros, para os quais reivindica a condição de instância territorial oficial.
Mais recentemente, sua proposta de revisão da macrorregionalização do Brasil (As regiões brasileiras pós-Tocantins: ensaio para um novo arranjo) teve repercussão nacional. Residindo em Campinas (SP), pode ser contatado pelo site www.donizetegeografo.com.br.
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Proposta polêmica e com implicações profundas não só apenas para o Pará, mas também para o restante do Brasil, o plebiscito para a divisão do Estado exige uma extensa discussão sobre seus desdobramentos. A partir da análise da proposta para os Estados de Tapajós e Carajás, o livro analisa a divisão territorial brasileira atual e possíveis mudanças, os critérios adotados e seus impactos econômicos, sociais e políticos.