Antonio Guerra fala sobre o processo de erosão dos solos

erosão é um processo no qual as partículas de solo são desagregadas por agentes externos, como chuvas, ventos, águas do rio ou pela ação do homem. Segundo o Portal da Educação, o Brasil perde anualmente aproximadamente 1 bilhão de toneladas de solos por conta da erosão.

Foto aérea do processo de erosão numa área em Piracicaba, com diversos trechos marrons sem vegetação.

Erosão de solo em Piracicaba, São Paulo (Fonte: Wikimedia Commons)

Convidamos Antonio José Teixeira Guerra, coordenador do Laboratório de Geomorfologia Ambiental e Degradação dos Solos (Lagesolos) da UFRJ, para aprofundar esse tema. Confira a entrevista abaixo e descubra como esse processo afeta o ambiente!

Comunitexto (CT): A erosão é um processo natural e o senhor menciona em seu livro que trouxe benefícios para o Rio Nilo. No Brasil existem casos semelhantes?

Antonio Guerra (AG): Sim, a erosão é um processo natural e existem benefícios para o Rio Nilo, porque os sedimentos orgânicos e inorgânicos que se depositam todos os anos dão maior fertilidade às suas planícies. No caso brasileiro, isso ocorre em diversos rios, sendo o mais conhecido deles o Rio São Francisco, em especial no trecho entre as cidades de Juazeiro (Bahia) e Petrolina (Pernambuco), separadas pelo rio. Essa área de agricultura irrigada é bem conhecida pelo plantio de uva, manga, coco, goiaba e frutas de um modo geral. Além dos processos naturais que dão origem à erosão, existe também a ação do homem que acelera esses processos e dão origem a uma série de problemas, como veremos mais adiante nessa entrevista.

CT: Como se pode caracterizar uma erosão descontrolada? Existe uma medida para defini-la?

AG: Essa forma de erosão, que é muito estudada pelos especialistas, é também chamada de erosão acelerada, onde o homem tem um papel importante porque, de acordo com o uso e manejo dos solos, pode causar essas formas erosivas, que são mais conhecidas por ravinas e voçorocas, feições lineares, que retiram toneladas de sedimentos dos solos e acabam levando esses sedimentos para rios, reservatórios e lagos.

CT: Existem inúmeros fatores que causam o processo de erosão, principalmente provocados pela ação do homem. No Brasil, qual o senhor considera mais grave?

AG: Os fatores que causam erosão podem ser de ordem natural, como os tipos de solos, a intensidade e quantidade de chuvas, as características das encostas e a cobertura vegetal. De um modo geral, mesmo acontecendo erosão em terras não cultivadas, ela geralmente não é tão intensa quanto nas áreas com agricultura e pecuária, onde o uso inadequado do solo, sem práticas conservacionistas, causa quase sempre ravinas e voçorocas, além do que chamamos de erosão laminar, que pode retirar muitas toneladas de solo por hectare, comprometendo a fertilidade natural dos solos, tornando-os pobres e quase estéreis, se nada for feito para reverter esse quadro.

CT: Quais são os danos mais imediatos e quais os que surgem em longo prazo por uma ação erosiva não natural?

AG: Os danos imediatos são a própria perda do solo, limitando o espaço físico para cultivar e criar animais, em especial onde foram formadas grandes voçorocas. A médio e longo prazo, a perda de fertilidade natural praticamente inviabiliza a agricultura, a menos que sejam repostos os nutrientes perdidos, através de adubação química e orgânica. A erosão é uma forma de degradação dos solos que causa danos não só nas áreas atingidas diretamente por esses processos geomorfológicos, mas também em áreas situadas fora das áreas atingidas, porque os sedimentos retirados das feições erosivas acabam assoreando rios, lagos, baias e reservatórios, através do transporte e deposição de sedimentos.

CT: Em sua obra, o senhor menciona que voçorocas acabam se tornando pontos turísticos. Onde isso ocorre? O senhor pode contar mais sobre isso?

AG: No caso dos pontos turísticos, isso acontece com as voçorocas de forma indevida, por exemplo, no litoral do Ceará e em outros pontos do litoral brasileiro, onde as voçorocas ocorrem muito próximas do mar, porque as pessoas acabam usando o topo e a base das voçorocas como atração turística. Só que pequenos deslizamentos que ocorrem nas bordas das voçorocas podem causar danos a esses locais, usados inadvertidamente como ponto turístico.

CT: Uma área muito degradada, com uma voçoroca, por exemplo, pode ser completamente recuperada? Em quais casos é possível a recuperação? E em quais não é?

AG: Na maioria das vezes, a recuperação das voçorocas é possível, onde houver interesse e disponibilidade financeira e técnica para tal. Existem diversas técnicas; uma delas é a utilização de biotêxteis, colocados nas paredes e no fundo das voçorocas, em conjunto com matéria orgânica e sementes para o desenvolvimento de plantas que irão recuperar, gradativamente, esses ambientes degradados.

Em locais onde as voçorocas atinjam grandes profundidades, geralmente mais de 15 ou 20 metros, o custo para a sua recuperação pode ser muito elevado. Não que seja impossível a recuperação, mas ela é deixada em segundo plano por esses motivos, em especial se for em áreas muito remotas, sem grande interesse econômico, ou onde a relação custo-benefício não seja vantajosa.

CT: Existem leis que garantam a preservação de ambientes para que isso não ocorra? Se sim, são eficazes? 

AG: As leis existem. Em especial nos locais que são Áreas de Preservação Permanente, também conhecidas por APP, que correspondem aos topos de morros, encostas com declividade superior a 45° e margens de rios. Como muitas vezes essa legislação não é cumprida, o surgimento de erosão acelerada nessas áreas é só uma questão de tempo. O respeito à legislação garante a proteção dessas áreas, sendo bem mais difícil ocorrer processos de erosão acelerada. Mesmo onde a legislação não proteja os ambientes, ela pode ocorrer devido à combinação de fatores de ordem natural e do uso e manejo do solo, como dito anteriormente nessa entrevista.


Para saber mais

Antonio Jose Teixeira Guerra e Maria do Carmo Oliveira Jorge, ambos integrantes do Laboratório de Geomorfologia Ambiental e Degradação dos Solos (Lagesolos) da UFRJ, organizaram um livro que aborda os temas desta matéria para a Oficina de Textos.

Processos erosivos e recuperação de áreas degradadas aborda a recuperação de áreas com técnicas de bioengenharia, a prevenção de acidentes, o papel das geotecnologias na identificação de feições erosivas e de movimentos de massa, o papel do clima nos estudos de prevenção e diagnóstico de erosão dos solos e movimentos de massa e muitos outros.

Capa de Processos erosivos e recuperação de áreas degradadas.