Haakon Fossen fala sobre as áreas de atuação da Geologia

A Geologia tem ganhado destaque no mercado nacional, com empresas cada vez mais preocupadas em contratar esses profissionais para realizar avaliações de impacto ambiental e terrenos antes da realização de obras, elaborar e realizar processos relacionados à exploração. Além disso, esses profissionais podem se aventurar por diversas áreas de atuação, como Engenharia Geológica, Geologia Ambiental, Geologia Forense, Mineralogia, Paleontologia e muitos outros.

Para contar mais sobre os campos de atuação e o ensino da Geologia, Haakon Fossen, professor de Geologia Estrutural na Universidade de Bergen, Noruega, ligado ao Departamento de Ciências da Terra, às coleções de História Natural e ao Centro de Pesquisa Integrada de Petróleo, e autor do livro Geologia estrutural, concedeu uma entrevista ao Comunitexto. Confira!

Comunitexto (CT): O Dia do Geólogo é celebrado em outros países no primeiro domingo de abril. Você pode nos contar um pouco mais sobre essa data?

Haakon Fossen (HF): Primeiro de tudo, eu acredito que o Dia dos Geólogos é uma excelente ideia e algo que poderia ser expandido para mais países. Na verdade, a primeira vez que ouvi falar dessa data foi por meio de colegas e amigos brasileiros. É, em outras palavras, não apenas algo celebrado na Escandinávia ou América do Norte, onde eu passei a maior parte da minha carreira acadêmica. Aparentemente, é uma invenção russa, que tem o intuito de marcar a transição entre o inverno e o verão, quando normalmente começam as expedições de campo (ao menos aqui no Hemisfério Norte). O momento é ideal para a celebração e também perfeito para viagens e cursos de campo.

CT: E para aqueles que vão começar a trabalhar com Geologia, o que eles poderiam fazer para obter sucesso nessa área?

HF: Primeiro, um conselho para os estudantes: escolham o direcionamento na Geologia que você mais gosta, o qual você acredita poder perseguir de maneira bem-sucedida, baseando-se nos seus interesses e habilidades. Não estude Geologia do Petróleo somente por acreditar que isso irá direcioná-lo para um trabalho melhor. A indústria do petróleo pode utilizar geólogos com diferentes experiências. Eu também acredito que se expor ao maior número de campos da geologia possíveis é bom. Existem chances de que você passe a maior parte de sua carreira profissional em um escritório, particularmente se você começar a trabalhar para uma companhia de petróleo.

Uma vez que você comece a trabalhar, é importante manter contato com a Ciência e a Academia (exceto se você realmente quiser se tornar um(a) administrador(a)). Leia jornais científicos dos seus campos de interesse e trabalho para não ser deixado para trás. Isso irá fazer com que seu trabalho se torne mais interessante e irá colocá-lo em uma boa posição para sugerir novas ideias, posicionando-o como alguém que sabe o que está fazendo e será chamado para projetos mais desafiadores. Para muitos geólogos também é uma grande vantagem saber falar inglês.

CT: Como a ocupação de geólogo mudou desde o início de sua carreira? As novas tecnologias tiveram um grande impacto no mercado de geologia?

HF: Tudo se tornou internacional. O inglês é muito mais importante em países que não usam esse idioma, como o Brasil. Eu tenho certeza que acontecerá um aumento na demanda pelo uso de inglês em muitos ramos das companhias de geologia (ou relacionados) do Brasil.

No lado mais técnico, eu realmente vejo uma mudança em relação ao uso frequente de modelos numéricos, ferramentas de GIS e relacionados, e dados mais sofisticados de sensoriamento remoto (sísmicos, dados de Lidar – tecnologia de sensoriamento remoto – etc.), que requerem um nível maior de habilidades técnicas.

No meio disso tudo, eu também daria ênfase nos princípios fundamentais da Geologia, que são tão importantes hoje quanto eram no passado.

CT: Qual é a parte mais difícil do seu trabalho?

HF: Como pesquisador, a parte mais difícil é decifrar as informações que estão contidas em dados sobre afloramentos, imagens sísmicas e outros, relacionados diretamente à Geologia. É interessante como nossas interpretações e percepções dependem dos exemplos vistos em livros, palestras e artigos que lemos e vimos. Às vezes precisamos parar e tirar algum tempo para repensar, voltar atrás e tentar modelos e interpretações diferentes, ter pensamentos independentes.

Outra coisa que pode ser difícil é prever coisas para um caso específico, baseado em conhecimentos gerais (pode ser senso comum), por exemplo, para caracterizar uma falha subsísmica em campos de petróleo. Analogias (uma ocorrência geológica que serve como modelo para outros processos ou ocorrências) somente oferecem visões estatísticas gerais; a melhor resposta relacionada a um local de perfuração sempre será incerta. Por exemplo, uma falha geológica é uma linha única em uma linha sísmica, mas, em detalhe (na escala subsísmica), essa falha consiste em duas ou três falhas e a consequência disso em reservas de hidrocarboneto pode ser enorme.

Como professor, a parte mais difícil do meu trabalho é ser capaz de explicar a Geologia para os meus alunos de uma forma que seja interessante e fácil de entender. Isso requer que você realmente saiba do que está falando, de modo que possa apresentar os temas de maneira simples. Usar muitos jargões pode funcionar se você quiser “se mostrar”, mas não funciona muito bem quando você quer transmitir uma mensagem.

CT: Quais são as melhores coisas da profissão de geólogo?

HF: Essa é fácil: estar em contato com rochas ou imagens de rochas, estar em campo estudando rochas e estruturas in situ (nos seus locais de origem), aproveitar a beleza das rochas e estruturas e, ao mesmo tempo, perceber que você é capaz de compreender um pouco da história que está por trás disso e se sentir cheio de admiração e respeito por essa complexidade.

CT: Qual foi o maior desafio da sua carreira?

HF: Acredito que foi escrever o livro Geologia estrutural.

CT: Como é um típico dia em seu trabalho?

HF: Tem realmente bastante variação. Sempre existe interação com os estudantes por meio de palestras ou, mais comumente, interações diretas com esses alunos da graduação, o que é bem legal. Então, eu também levo um tempo para trabalhar em artigos ou capítulos de livros, e às vezes alguém aparece com uma rocha ou mineral sobre o qual quer saber mais. Em outros dias, fico focado em reuniões de projetos de pesquisa, trabalhos ou cursos de campo; em outros dias, ainda, para aplicar exames ou trabalhos. Ainda bem que ainda sobra um tempo para ficar em campo.

CT: O senhor veio ao Brasil recentemente para lançar o livro Geologia estrutural. Como foi essa experiência? Foi muito diferente de suas experiências na Noruega?

HF: Ser capaz de realmente lançar um livro em uma grande conferência foi uma experiência nova para mim. Isso me deu a oportunidade de ter contato com os leitores do livro, especialmente estudantes, mas também membros de universidades e alguns geocientistas da indústria, e ouvir os comentários que eles tinham a fazer.

A conferência também foi muito maior do que aquela que ocorre paralelamente na Noruega, o que é esperado em um grande país como o Brasil. Por outro lado, estudantes e professores de geologia têm coisas em comum no mundo todo e eu senti que é fácil “se encaixar”. Claro, poderia ter sido muito mais fácil se eu soubesse falar melhor a língua portuguesa!

CT: Seu livro foi traduzido para outras línguas e a versão em português passou por alguns ajustes. Essas adaptações foram realizadas em outros países?

HF: Na verdade, a versão em português foi majoritariamente traduzida da versão original em inglês. O livro, desde então, foi publicado na Coreia, novamente com uma tradução direta. Seria ótimo trocar algumas fotos e exemplos por exemplos brasileiros, mas já temos um ou dois na versão que foi feita no País.

CT: Quando você decidiu escrever um livro sobre geologia estrutural? Como foi esse processo?

HF: Eu comecei a flertar com essa ideia há muito tempo, não muito depois de ter finalizado minha graduação. Então, relembrei o meu intuito quando comecei a ensinar Geologia Estrutural na Universidade de Bergen, em 1997, desenvolvendo um compêndio ao longo dos anos que se passaram. Então, durante um período sabático, em Salt Lake City, em 2002/2003, decidi transformá-lo (o compêndio) em um livro em norueguês (publicado em 2005). Fazer a versão norueguesa do livro foi uma boa experiência e, então, comecei a escrever a versão em inglês. Não fiz uma tradução, reescrevi tudo do início. Se unir tudo, foi um longo processo no qual eu usei bocados da minha vida de geólogo, desde excursões para campos no passado, quando era estudante, minha experiência na indústria de óleo até minha vida como um profissional acadêmico na universidade.

CT: Você também tem um site no qual disponibiliza informações extras sobre geologia estrutural para seus leitores. Você desenvolveu esse material antes ou depois de escrever o livro?

HF: Muito desse material foi desenvolvido durante o projeto do livro, mas uma parte foi finalizada depois. Meu plano era apresentar uma combinação entre os livros tradicionais e módulos de e-learning (aprendizado virtual), com ilustrações animadas que transmitissem a dinâmica dos processos de geologia estrutural, junto com recursos como fotos e exercícios.

CT: Como os profissionais de geologia podem utilizar redes sociais ou sites para alavancar a carreira?

HF: Eu acredito que todo professor, e também muitos outros geocientistas, deva ter um site que inclua alguns materiais de aula que relatem quais são os campos de estudo nos quais são especialistas. Também vejo muitos sites e blogs altamente interessantes feitos por estudantes de graduação e jovens profissionais. Pessoas que fazem isso irão desenvolver novas habilidades e descobrirão novos lados da Geologia. Isso pode ser útil em entrevistas de emprego.

As redes sociais também podem ser usadas para compartilhar imagens de descobertas interessantes de expedições de campo, experimentos, dados sísmicos e muito mais, o que poderá levar a discussões úteis.

Haakon Fossen também concedeu outra entrevista ao Comunitexto. Confira!


Tudo a ver

A obra Geologia estrutural traz um capítulo inteiro recheado de fotos e conceitos sobre falhas. De autoria do professor e pesquisador Haakon Fossen, traz novas abordagens sobre temas como deformação plástica ou dúctil e deformação rúptil.

Capa de Geologia estrutural.

Disponível em nossa livraria técnica!

O autor também conduz o leitor de forma agradável e didática pelos conceitos de geologia estrutural e análise estrutural, explicando as deformações em rochas, o esforço (stress) e a reologia. Em seguida, dedica-se à diferenciação entre a deformação plástica cristalina e a deformação rúptil, aprofundando-se nas características desta última: as dobras e dobramentos, a foliação e a clivagem, lineações, a boudinagem e as zonas de cisalhamento.

Os regimes tectônicos principais são então apresentados, pouco antes de um aprofundamento na tectônica do sal – que recebe um capítulo à parte. O livro conta ainda com um capítulo sobre os princípios de restauração e balanceamento, com muitos exemplos práticos, e um capítulo final que estabelece vínculos entre a petrologia metamórfica e a estratologia.

Ideal para todos que buscam uma obra com relação muito próxima entre conteúdo e prática, que se complementa com variados exemplos, imagens de campo e esquemas explicativos.


Haakon Fossen é professor de Geologia Estrutural na Universidade de Bergen, Noruega, ligado ao Departamento de Ciências da Terra, às Coleções de História Natural e ao Centro de Pesquisa Integrada de Petróleo (Centre for Integrated Petroleum Research, CIPR).

Sua experiência profissional inclui atividades em exploração e produção na Statoil, além de mapeamento geológico e exploração mineral na Noruega. Sua pesquisa abrange de rochas cristalinas a rochas sedimentares e sedimentos, em tópicos como dobras, zonas de cisalhamento, formação e colapso da Orogênese Caledoniana, modelagem numérica da deformação (transpressão), evolução do rifte do Mar do Norte e estudos de arenitos deformados do oeste dos Estados Unidos.

O autor realizou longos trabalhos de campo em várias partes do mundo, principalmente na Noruega, em Utah/Colorado (EUA) e no Sinai (Egito), englobando mapeamento geológico, petrografia, modelagem física e numérica, geocronologia e interpretação sísmica.

Tem participado como editor de vários periódicos geológicos internacionais, publicou mais de 90 artigos científicos, além de dois livros e vários capítulos de livros. Além disso, leciona Geologia Estrutural em cursos de graduação há mais de dez anos, com ênfase no desenvolvimento de recursos didáticos eletrônicos para auxiliar na visualização e compreensão das estruturas geológicas.

Fábio Ramos Dias de Andrade (tradutor da obra), natural de Blumenau, é geólogo formado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Fez mestrado e doutorado na Unesp, em assuntos relacionados à origem das rochas. Parte de seu doutorado foi desenvolvido na Espanha, no GFZ-Postdam, onde pesquisou a formação de carbonatitos (rochas vulcânicas muito raras). Desde 1999 é professor da Universidade de São Paulo. Após ganhar um concurso de redação aos 8 anos, Fábio não parou mais de escrever. Hoje, brinca que é um escritor que trabalha como geólogo.