Mandioca, a mais brasileira das culturas, é fundamental na segurança alimentar do mundo – parte 3

Mandioca, aipim, macaxeira, uaipi, maniva são alguns dos nomes em que essa importante tuberosa é conhecida no País 

15. Exigências nutricionais, calagem e adubação da mandioca

Originária de região tropical equatorial e domesticada em uma vasta região onde prevalecem solos antigos, intemperizados, a planta da mandioca se adaptou a ambientes de solos com muito baixa fertilidade. A despeito disso, a cultura da mandioca extrai elevadas quantidades de nutrientes do solo, principalmente potássio (K) e nitrogênio (N). Considerando que ao final do ciclo são colhidas tanto a parte aérea quanto as raízes tuberosas, o que resulta em remoção de quantidade elevada de nutrientes, tal fato propicia que a mandioca seja considerada espécie esgotante do solo. 

Dessa forma, no planejamento da cultura temos que proceder à avaliação da fertilidade (análise do solo) e às correções que se fizerem necessárias ao pleno crescimento e desenvolvimento das plantas. 

Na avaliação da fertilidade, a amostragem de solo deve ser feita com antecedência de 90 dias do plantio, enviando imediatamente as amostras ao laboratório para que sejam feitas a análise química e as devidas recomendações de um profissional de Agronomia. Esse intervalo é suficiente para o produtor receber as recomendações do Engenheiro-Agrônomo, adquirir os produtos e, caso necessário, aplicar o calcário, permitindo a sua reação no solo antes do plantio ser efetuado.

15.1 Acidez do solo e calagem

15.1.1 Cálculo de calagem

A mandioca é uma espécie que apresenta tolerância à acidez e a elevados níveis de Al+3 no solo. A despeito disso, em solo ácido e com elevada saturação em Al+3 (>80%), a aplicação de calcário propicia aumentos de produtividade, principalmente pelo fato de elevar o pH do solo, neutralizar Al+3 trocável e fornecer Ca+2 e Mg+2 às plantas.

No cálculo da quantidade de calcário a ser utilizada, empregando o método de saturação em bases (V%), a saturação adequada ao pleno crescimento e desenvolvimento da planta de mandioca é de 50%. Entretanto, em solos com muito pobres, com baixa capacidade troca de cátions (CTC), corrigir a saturação por bases para 40%.

15.1.2 Aplicação do calcário – calagem

Na atualidade, nas diversas regiões brasileiras onde se cultiva mandioca, a maioria dos solos apresenta muito baixa CTC, consequentemente, a quantidade de calcário recomendada é baixa, em geral variando de 0,5 a 2,0 toneladas por hectare. Mas essa quantidade é fundamental para o alcance de elevadas produtividades.

Quanto à aplicação da calagem, ela pode ser feita em qualquer época do ano, sendo importante que anteceda o plantio em pelo menos um a dois meses, permitindo sua reação no solo com a umidade advinda da ocorrência de chuvas, ou de irrigação. O calcário deve ser aplicado a lanço em toda a área, de modo uniforme, sendo incorporado até a profundidade de 20 a 30 cm. 

15.2 Adubação da cultura da mandioca

Adubação nitrogenada:

Na cultura da mandioca, diversas fontes de nitrogênio (N) podem ser utilizadas, sejam elas orgânicas, organominerais e minerais. Em geral, observa-se que, embora a mandioca extraia elevadas quantidades de N do solo, incrementos de produtividade decorrentes do fornecimento de N mineral é relativamente baixo. Porém, a reposição do adubo nitrogenado nos primeiros 45 a 60 dias após a emergência das brotações é necessária para proporcionar crescimento vegetativo rápido.

Adubação fosfatada:

Em geral, os solos das áreas onde se cultiva mandioca nas regiões tropicais e subtropicais são muito pobres em fósforo (P). Essa adaptação a solos com baixos níveis de fósforo está relacionada à efetiva associação simbiótica existente entre as raízes fibrosas da mandioca com fungos micorrízicos vesículo-arbusculares, que ocorrem naturalmente nos solos. Nessa associação, a planta da mandioca fornece fotoassimilados ao fungo e, em contrapartida, o fungo fornece à planta o fósforo inorgânico (Pi). O efeito benéfico das micorrizas vesicular-arbusculares ocorre particularmente em razão do sistema radicular reduzido, pouco ramificado, com poucos pelos radiculares, que a planta da mandioca apresenta. Nessa associação, as hifas externas do fungo podem se estender ao solo, funcionando como um sistema radicular adicional, e absorver água e nutrientes em um maior volume de solo, transferindo-os para as raízes colonizadas.

Os trabalhos de pesquisas desenvolvidas nos trópicos mostram que a adubação fosfatada propicia incrementos significativos na produtividade da mandioca, principalmente em solos com baixos teores de fósforo (P), e que o nível crítico é 7,0 mg de P dm–3 de solo, obtido pelo extrator de Mehlich.

Adubação potássica:

Na atualidade, nas diversas regiões brasileiras onde se cultiva mandioca, a maioria dos solos apresenta muito baixa fertilidade, com teores de K disponíveis variando de baixos (< 0,05 cmolc dm–3) a médios (0,06 a 0,10 cmolc dm–3). Nesse contexto, o fornecimento de adubação potássica torna-se fundamental para propiciar bom crescimento e desenvolvimento das plantas, uma vez que o nível crítico de potássio é 0,1 cmolc dm–3 de solo, pelo extrator de Mehlich.

Adubação com micronutrientes:

Resultados de algumas poucas pesquisas desenvolvidas em solos pobres, ácidos, oriundos principalmente em áreas de Cerrado, evidenciaram os benefícios do fornecimento de boro e de zinco para a cultura da mandioca. Entretanto, em geral, não têm sido observados efeitos marcantes dos micronutrientes na produção de raízes tuberosas de mandioca.

Quando fornecer a adubação?

A adubação orgânica deve ser feita a lanço e incorporada antes do plantio, ou diretamente no sulco ou cova de plantio. De forma análoga, a adubação organomineral, fosfatada e de micronutrientes deve ser feita diretamente no sulco ou cova de plantio, abaixo e ao lado das manivas, evitando o contato do adubo químico com as manivas.

Por sua vez, o fornecimento de adubação química nitrogenada e potássica deve ser efetuado em cobertura, no período de 45 a 60 dias após a brotação das manivas. Quanto aos micronutrientes, caso venham a ser recomendados, podem ser aplicados por ocasião do plantio, ou em cobertura, via solo, ou mesmo via foliar.

16. Doenças da cultura e seu controle

Muito embora seja uma espécie de considerável rusticidade, a mandioca é afetada por diversos grupos de patógenos causadores de doenças (bactérias, fungos, vírus, fitoplasmas), que podem vir a comprometer a produtividade das lavouras. Nesses grupos, incluem-se patógenos que atacam a parte aérea e aqueles que atacam as raízes tuberosas, os quais causam podridão das mesmas.

Na Região Centro-Sul (SP, MS, PR) as doenças mais frequentes, e que resultam em prejuízos nas lavouras, são a antracnose, a bacteriose, o superalongamento e as podridões radiculares.

As medidas de controle das diversas doenças incluem a utilização de cultivares tolerantes/resistentes, a utilização de material de plantio de elevada qualidade, a nutrição adequada das lavouras, e principalmente, proceder à rotação de culturas.

17. Insetos-pragas na cultura da mandioca

A cultura da mandioca tem ciclo de produção bianual, o que a torna mais propensa ao ataque de inúmeros insetos-pragas, sendo que alguns deles podem causar perdas significativas nas lavouras. Os principais danos causados são a desfolha, a sucção de seiva e o broqueamento de hastes e de raízes tuberosas. 

Na Região Centro-Sul (SP, MS, PR), e mesmo em outras partes do Brasil, as principais pragas presentes nas lavouras da mandioca são mandarová-das-folhas, percevejo-de-renda, mosca-da-mandioca, tripes, mosca-das-galhas, mosca-branca, ácaro-verde, broca-da-haste, cochonilha-das-raízes, formigas-cortadeiras e cupins.

A maneira mais adequada e eficiente de combater o ataque de artrópodes-praga é pela adoção do manejo integrado de pragas (MIP), em que são feitos uso e integração de diversas táticas/práticas, tais como controle cultural, biológico, físico, comportamental e químico. No que diz respeito ao controle químico, é sempre preferível observar os níveis de controle (tomada de decisão por amostragem, quando disponível) e escolher inseticidas seletivos que contribuam para a conservação de inimigos naturais. Nesse contexto, é fundamental consultar um Engenheiro-Agrônomo.

O aumento da frequência de plantio e do tamanho da área cultivada com mandioca também contribui significativamente para aumentar as populações de pragas. Dessa forma, a rotação de culturas é também uma prática relevante para o manejo adequado das pragas da mandioca.

18. Métodos de colheita

A colheita das raízes tuberosas de mandioca, que representam o componente de maior valor comercial da cultura, demanda muita mão de obra, e é uma das tarefas mais difíceis para mecanizar na cultura. Entre diversas razões, temos a forma e a distribuição das raízes tuberosas no solo, a coleta das folhas e de material propagativo (ramas para o próximo plantio) e a aderência do solo às raízes tuberosas. 

Em função dessas dificuldades, a colheita ainda é feita manualmente na mandioca de mesa e na mandioca para a indústria em pequenas áreas de cultivo, enquanto em áreas médias e grandes, a colheita é feita, geralmente, de forma semimecanizada, que não dispensa o uso de mão de obra.  Nesse contexto, em qualquer dos sistemas de colheita utilizados, a demanda de mão de obra é grande, fato que resulta em participação elevada no custo de produção (35% a 40%). Essa grande demanda de mão de obra, além de participar com maior valor no custo de produção, atualmente é o fator limitante devido à sua escassez no campo.

Já há muito tempo, no Brasil, vem-se buscando alternativas de máquinas e de equipamentos para a mecanização completa da colheita da mandioca, mas apenas mais recentemente tais alternativas estão começando a se tornar viáveis. É só considerarmos que as primeiras tentativas de efetiva mecanização da cultura da mandioca aconteceram por ocasião da implantação do Programa Nacional do Álcool, que aconteceu em 1973, quando tivemos a Primeira Crise Mundial do Petróleo. Após uma fase de euforia, o assunto foi deixado de lado, e as atividades só voltaram a ter destaque nos anos 1990, quando surgiram máquinas de plantio mais modernas. E, para que seja dada sequência nesse processo, é necessário que sejam efetuados consideráveis e continuados investimentos em Ciência, Tecnologia e Inovação, pois, de outra forma, jamais teremos avanços, ou tais avanços demorarão muito a acontecer.

19. Conclusões gerais

As folhas e as raízes tuberosas da planta da mandioca são consumidas in natura, preparadas de diferentes formas, e usadas na alimentação do brasileiro no dia a dia. Tais raízes tuberosas, quando são processadas, resultam em uma infinidade de produtos alimentícios, entre os quais se incluem farinha seca, farinha d’água, polvilho doce, goma de tapioca, xarope de glicose, entre outros importantes produtos derivados do amido. 

Destaque especial deve ser dado ao amido de mandioca, por possuir uma característica especial: é livre de glúten, que é uma proteína encontrada nos grãos de trigo, aveia, centeio e cevada. Essa qualidade abre oportunidade no mercado de produtos direcionados à saúde e ao bem-estar das populações que são alérgicas ao glúten (celíacas).

Veja também a primeira e a segunda parte dessa matéria!

Para mais informações, não deixe de conferir a obra Mandioca: do plantio à colheita!

Capa de Mandioca: do plantio à colheita.